Como as crianças aprendem a conviver com o luto

Tragédia em escola de Suzano reacende a questão da perda de um familiar, amigo ou colega entre crianças e adolescentes. Psicopedagoga explica que o luto na fase infantil precisa ser discutido de forma natural

Luto, solidão e tristeza, sentimentos cada vez mais presentes na pandemia (Banco de imagens)
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Na última quarta-feira (13/03), brasileiros vivenciaram uma tragédia. Dois jovens entraram numa escola em Suzano (SP) e assassinaram cinco estudantes com idades entre 15 e 17 anos, além de duas funcionárias da instituição.

A tragédia soma-se aos tristes episódios do massacre de Realengo (RJ), em abril de 2011, e do ataque em uma escola de Goiânia (GO), em outubro de 2017, que também deixaram mortos e feridos. O que essas tragédias têm em comum? Aconteceram dentro de um ambiente escolar, onde convivem milhares de crianças e adolescentes.

Diante do cenário de dor e perda, os estudantes precisam lidar com o luto, com o fato de que perderam amigos e colegas. Precisam lidar ainda com o impacto emocional causado pela tragédia. É comum que crianças em luto expressem seus sentimentos mais através de comportamentos do que por meio de palavras, isso porque ainda estão se desenvolvendo emocionalmente.

É necessário que a família e a escola onde a criança estuda trabalhem algumas necessidades, que podem ajudar os pequenos a lidarem com a perda de um colega ou amigo. Uma dessas necessidades é o reconhecimento de que a morte é um ciclo natural, uma realidade. Permitir que a criança “sinta a dor” da perda também faz parte do processo de aceitação, como explica a psicopedagoga e orientadora educacional Keila Espíndola, do Colégio Objetivo de Brasília.

Quando você fala com eles abertamente, podem estar mais tristes, porém mais receptivos. A tendência é que fiquem mais atentos uns com os outros, que se preocupem mais com o coleguinha. Quando você conversa de forma aberta, o medo que uma tragédia semelhante aconteça novamente vai diminuindo”, explica a psicopedagoga.

Outra forma de “aliviar” a dor da perda é receber apoio de pessoas próximas, familiares e ainda de profissionais, como psicólogos, psiquiatras e orientadores, que possam apoiar o estudante durante o processo de luto. O apoio entre colegas também é imprescindível, como destaca Keila Espíndola.

Diante de uma tragédia, os educandos criam uma consciência maior e começam a apoiar um ao outro, criam condições emocionais, começam a compreender melhor a tristeza. Eles percebem que a dor de um é a dor do outro, e criam uma base emocional mais sólida”, conclui a especialista.

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Para psiquiatra forense, massacre ultrapassa fronteiras da ciência

Enquanto choca pais inteiro, o crime bárbaro de Suzano continua desafiando especialistas em entender a mente humana. Para Ricardo Patitucci, psiquiatra forense, a explicação para o massacre que ocorreu em Suzano ultrapassa as fronteiras da psiquiatria, e esta ciência sozinha não pode compreendê-lo por completo. No entanto, é necessário investigar se os indivíduos responsáveis pelos assassinatos sofriam de algum transtorno mental.

A maioria dos crimes possui uma motivação, mas quando ela não está clara – e até nos parece incompreensível – são grandes as chances de estarmos frente a um ilícito cometido por um indivíduo desprovido de sanidade. Esse é um dos preceitos da psiquiatria forense, área do conhecimento que estabelece uma ponte entre a psiquiatria e o direito. E que, dentre outras atribuições, busca responder às seguintes perguntas: o avaliado possui transtorno mental? Se sim, esse transtorno prejudicou o seu entendimento sobre a realidade no momento do crime? O transtorno prejudicou o controle do indivíduo sobre si próprio no momento do crime? “.

Ele exemplifica o assunto da seguinte forma: imagine um indivíduo de 30 anos, que apresenta retardo mental, nunca conseguiu se alfabetizar, não reconhece o valor do dinheiro, não compreende metáforas, não sabe andar sozinho pela rua e não consegue realizar sua higiene pessoal sem auxílio. Pense que ele está com fome e, ao caminhar por uma feira livre, pega algumas frutas sem pagar e vai embora.

A princípio podemos julgar que ele cometeu um furto e que deve responder criminalmente por isso. Porém, voltando às perguntas feitas anteriormente, constatamos que ele possui um transtorno mental e que, como não compreende o valor do dinheiro, não possui o correto entendimento sobre o ato que cometeu.

Segundo Dr. Patitucci, mediante um laudo do psiquiatra forense, o indivíduo pode ser considerado pelo juiz que o avaliará como inimputável, ou seja, incapaz de se responsabilizar pelo que fez. E deste modo, isento de pena. Tal exemplo é emblemático, mas se estende a casos de psicose, alterações de comportamento decorrente de demências, surtos do transtorno bipolar, entre outros.

É importante ressaltar que cada situação é única e não se pode realizar nenhuma generalização sobre esse assunto. Por exemplo, a afirmação de que “todo indivíduo com esquizofrenia não sabe o que faz” é falsa, pois dada a situação e o quadro evolutivo do indivíduo, pode ser que uma pessoa com esquizofrenia saiba exatamente o que fez”, destaca.

Autópsia psiquiátrica: o que é isso?

No caso da chacina em Suzano, ele alerta que é necessário se realizar a chamada “autópsia psiquiátrica”. Esse recurso é utilizado quando se analisa a sanidade mental de um indivíduo que já morreu.

Mas como é possível emitir esse parecer sem entrevistar a pessoa? Dr. Ricardo ressalta que certamente é uma situação complexa e que exige grande perícia do psiquiatra forense. Para isso são recolhidas o máximo de informações sobre o avaliado, e isso inclui: entrevista com familiares e pessoas de seu círculo de convivência, avaliação de comportamentos prévios, registros feitos por ele em mídias sociais, conteúdos armazenados em seu computador, preferências, registros médicos prévios, histórico e relatório escolar, padrões de relacionamentos afetivos, entre outros.

Assim, é leviano, neste momento, emitir qualquer parecer psiquiátrico-forense sobre a tragédia ocorrida em São Paulo sem antes termos acesso detalhado a maior parte destas informações”, conclui  Dr. Ricardo Patitucci.

Da Redação, com Assessorias

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