‘As pessoas culpam a ostomia, mas ela não é o problema; é a solução’

No Dia Nacional da Pessoa Ostomizada, conheça histórias de superação e saiba como ajudar a combater o preconceito e garantir seus direitos

Andreia Muniz (Foto: Divulgação)
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Colostomia, ileostomia, urostomia, gastrostomia e traqueostomia. Todas essas intervenções cirúrgicas são realizadas em pessoas que, por motivos de saúde ou acidente, precisam de um canal alternativo em seu corpo para eliminar as fezes ou a urina ou mesmo para auxiliar na alimentação ou na respiração.

Estimativas globais indicam que a quantidade de indivíduos ostomizados é de 0,1% da população em todo o mundo. No Brasil não existem números exatos sobre quantas pessoas são portadoras de ostomias, mas, segundo o Ministério da Saúde, a estimativa é que haja cerca de 400 mil ostomizados no país ou cerca de 120 mil pessoas com estomia – considerando apenas estomas de eliminação -, sendo cerca de 15 mil novos casos por ano. 

Essas pessoas precisaram passar por um procedimento cirúrgico que cria um novo trajeto para eliminar a urina e as fezes, com a necessidade de utilização de bolsas coletoras. A realização do procedimento acarreta mudanças no estilo de vida das pessoas, que envolvem desde a aprendizagem do autocuidado com a estomia até alteração das atividades sociais e cotidianas.

Infelizmente, muitos pacientes que passam pelo procedimento ainda precisam enfrentar a falta de informação e o preconceito. Para alertar a população sobre a importância de combater o preconceito contra as pessoas que convivem com o procedimento da ostomia, o dia 16 de novembro foi escolhido como Dia Nacional dos Ostomizados. A data é uma homenagem à fundação da Sociedade Brasileira dos Ostomizados (Abraso), em 1985.

Conheça algumas histórias de superação de pacientes ostomizadas:

Alvos de preconceito e da falta de informação

Andreia Muniz aprendeu a conviver bem com a bolsa de colostomia (Foto: Divulgação)

Na maioria dos casos, as pessoas que passam por esse tipo de cirurgia acabam sendo vítimas de preconceito. É o caso de Andreia Muniz, de 35 anos, é ostomizada há três por conta de uma endometriose profunda, entre outras complicações de saúde que a levaram a uma cirurgia para retirada de um tumor no intestino.

Segundo Andreia, o preconceito às vezes vem de quem menos se espera. Quando ela chegou para uma consulta de rotina, com a bolsa à mostra, foi repreendida pelo próprio médico que alegou que ela não precisava expor a bolsinha.

A situação piorou quando perguntei se podia entrar na piscina com a bolsa, pois pretendia viajar. Para minha surpresa, ele falou que não, que era muito nojento. Simplesmente, ignorei e viajei. Mas, confesso que não fiquei à vontade, escondi a bolsinha com receio de que as pessoas percebessem. Mas, depois do ocorrido, decidi que não deixaria ninguém mais agir dessa forma”, afirma.

Apesar da decisão, colocá-la em prática não foi tarefa fácil. Andrea precisou superar momentos difíceis, que a levaram a enfrentar uma depressão. A superação veio com a coragem de enfrentar o quadro. Hoje, ela produz capinhas coloridas e divertidas para sua bolsa, trabalho que passou a divulgar por meio de suas redes sociais.

A atitude lhe rendeu incentivos e contatos com outros ostomizados, que passaram a solicitar encomendas. “Queria mostrar que os ostomizados precisam de cuidado, sim, mas podem levar uma vida normal com leveza e bom humor, desde que a gente se aceite primeiro”, reconhece Andreia.

‘Levei um tempo para entender que a limitação estava na minha cabeça’

A cirurgia representa uma mudança radical na vida dessas pessoas e por isso o foco é mostrar o lado positivo de ter uma chance a mais. Medo, insegurança, vergonha, constrangimento são os sentimentos que vêm à mente. No entanto, a operação em si é considerada a operação da vida, de uma oportunidade de continuar com quem se ama e, como tantos, tornar isso uma conquista, não uma derrota.

Ser uma ostomizada representa enfrentar dificuldades, sobretudo em lugares públicos. Isso sem contar o olhar de preconceito das pessoas a nossa volta, o que nos causa constrangimento e faz com que percamos a vontade de sair de casa”, afirma Sandra Neves Rabelo que, há sete anos, convive com uma bolsa de colostomia após o tratamento de um câncer de colo de útero que afetou seu intestino devido à radioterapia.

Em seu processo de recuperação, ela conta que, embora tivesse o apoio da família, se sentia muito triste, inconformada com a situação, o que a levou a um processo de negação do quadro. “Levei um bom tempo para perceber que precisava me aceitar, entender que estava saudável, que não estava sozinha e que muitas outras pessoas enfrentam o mesmo quadro que o meu. Que a limitação estava na minha cabeça”, lembra ela.

Lilian Castro, com doença de Chron há 21 anos e estomizada há três, diz que a vida dela só mudou pra melhor depois que começou a usar a bolsa. “Antes, eu nem saía de casa, pois tinha medo de me sujar e não ter como me limpar”, diz ela, que mora em São Paulo, capital.

Lilian Castro disse que a vida só mudou depois que passou a usar a bolsa de colostomia (Foto: Divulgação)

Dificuldades no acesso e falta de banheiros adaptados

Entre as dificuldades diárias enfrentadas está, por exemplo, a questão da acessibilidade a banheiros adaptados fora de casa.

A falta de banheiros com uma duchinha é um transtorno para nós, ostomizados. Não temos controle sobre o estoma, então, se ele funciona e enche a bolsinha enquanto estamos na rua, não tem jeito: tem que trocar, senão ela pode vazar. Mas os banheiros públicos não atendem nossas necessidades de higiene, e isso é um grande dificultador”, lamenta Andreia.

Segundo Andreia, é importante vencer o preconceito. “As pessoas culpam a ostomia, quando, na verdade, ela não é o problema. Ela é a solução. Se não houvesse essa cirurgia, a maioria das pessoas estaria morta. Há tanto a se falar de positivo, mas as pessoas insistem em focar no negativo. Eu jamais permiti isso pra mim”, diz ela, que mora em Uberlândia (MG).

Andreia conta que uma das principais dificuldades é encontrar banheiros acessíveis e adequados (Foto: Divulgação)

Médico fala sobre os desafios de lidar com a estomia

De acordo com o médico coloproctologista Carlos Mateus Rotta, a realização de uma estomia pode ser decorrente de problemas do sistema gastrointestinal, traumatismos colorretais, anomalias congênitas e, principalmente, câncer de cólon e reto. E deve ser realizado em todas as doenças que envolvam, em seu tratamento, o desvio do trânsito intestinal.

O coloproctologista ressalta que, o maior desafio dos pacientes com esse quadro, é aprender a conviver com a nova situação e que para isso é muito importante reconhecer que a estomia salvou a vida delas. “O ideal é sempre contar com acompanhamento psicológico, nutricional e de um enfermeiro especializado em estomia, suporte essencial para que o paciente viva bem com a colostomia”, afirma o especialista.

Para Joyce de Souza, gerente do Programa Ativa da Coloplast, um atendimento humanizado torna o dia a dia mais leve e fácil para quem precisa se adaptar a essa nova realidade. “Desde o primeiro contato, o enfermeiro tem que estabelecer uma relação de confiança, proximidade e acolhimento com esses usuários. Suas orientações promovem, sem dúvida, uma melhor qualidade de vida para essas pessoas, dando a elas empoderamento, independência e segurança, informando, inclusive, os seus direitos no atendimento pelo SUS”, diz ela. 

Produtos garantem bem-estar na ostomia

Segundo Sandra, o odor das fezes pode constranger e até levar a pessoa ostomizada a se isolar. Por conta disso, várias empresas têm desenvolvido soluções e produtos que tragam bem-estar ao público ostomizado. Um deles é o bloqueador de odor.

Ela conta que há alguns meses conheceu um produto, na casa da sua irmã, que, garante, mudou seu comportamento na hora de fazer a higienização da bolsinha. “Não sinto mais vergonha, espirro o bloqueador de odor no vaso sanitário, como recomenda a fabricante FreeCô, esvazio a bolsa e não fica nenhum cheiro. O produto foi libertador pra mim”, revela.

Em meio a uma rotina repleta de operações, médicos e de um exercício constante para manter a autoestima elevada, Vivi de Oliveira, de 32 anos e ostomizada desde os 2 anos de idade, criadora e administradora do maior grupo de ostomizados do Brasil, conheceu em 2016 um produto que transformou a sua vida para melhor, conforme conta.

“Conheci um gelificador com essência de lavanda criado a partir de relatos e das dificuldades enfrentadas por pessoas ostomizados. O item consiste em cápsulas com solução gelificante que, somadas a uma essência de óleo puro de lavanda, garantem o odor mais agradável assim que a bolsa é preenchida”, conta ela.

Usuária do produto, ela se transformou em embaixadora da Vuelo Pharma, empresa paranaense que produz o gelificador. De acordo com o fabricante, além do resultado olfativo, a solidificação dos resíduos promovida pelo produto facilita o esvaziamento do recipiente, enquanto o óleo colabora para a limpeza mais rápida da bolsa e aumenta a vida útil do item (que costuma ser reutilizada durante dois ou três dias).

Nosso objetivo é proporcionar a essas pessoas mais autonomia, qualidade de vida e um retorno feliz à socialização. O Gelificador é um item importante para o resgate da autoestima dessas pessoas, ao mesmo tempo que torna a rotina mais fácil, uma vez que contribui para a neutralização de odores e diminui os riscos de vazamentos da bolsa. É a chance de os ostomizados viverem sem medo de julgamentos ou constrangimentos.”, explica Thiago Moreschi, diretor da Vuelo Pharma.

Conheça os direitos da pessoa ostomizada

A abertura artificial entre os órgãos internos com o meio externo pode ser chamada de ostoma ou estoma. Quem porta o ostoma é conhecido como ostomizado. Esta condição pode ser temporária ou permanente. E existem garantias legais ao paciente por este procedimento limitar ou incapacitar o desempenho de suas atividades habituais.

O paciente ostomizado é considerado uma pessoa com deficiência física, conforme determina o Decreto nº 3.298/1999, artigo 4, inciso 1. Portanto, tem os mesmos direitos assegurados no Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei nº 13.146/2015).

Cada paciente é um caso específico, por isso, os benefícios podem variar. Além disso, existem ainda muitas outras leis municipais e estaduais que fortalecem a autoestima e a inclusão do ostomizado. Em caso de dúvida, consulte um advogado de confiança”, afirma o advogado Fabrício Posocco, do escritório Posocco & Advogados Associados;

Na área da saúde, a legislação garante:

– Estrutura especializada, com área física adequada, recursos materiais específicos e profissionais capacitados (Portaria SAS/MS 400/2009);
– Distribuição gratuita de bolsa, sonda, coletor e adjuvantes de proteção e segurança (RN 325/ANS);
– Tratamento fora do domicílio (SUS).

No âmbito social, a pessoa ostomizada tem direito a:

– Um salário-mínimo mensal enquadrado no Benefício de Prestação Continuada (BPC) da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS);
– Saque do PIS;
– Saque do FGTS;
– Auxílio-doença ou aposentadoria por invalidez concedido ao segurado da Previdência Social;
– Isenção de imposto de renda na aposentadoria por invalidez;
– Isenção de ICMS, IPVA, IPI e IOF na compra de veículos adaptados;
– Quitação da casa própria;
– Aquisição de imóvel para moradia própria nos programas habitacionais do governo;
– Resgate de prêmio de seguro ou previdência privada;
– Passe livre em transporte coletivo;
– Liberação do rodízio de automóveis na cidade de São Paulo.

O paciente ostomizado tem atendimento prioritário em:

– Órgãos da administração pública;
– Empresas prestadoras de serviços públicos;
– Instituições financeiras;
– Embarque e desembarque em aeronaves;
– Julgamento de processos.

Com Assessorias

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