De crianças a adultos: livros celebram a igualdade racial

‘Ler Faz Bem’ traz dicas de leitura para ajudar a difundir mais conhecimento sobre violências e desigualdades sociais que negros ainda sofrem

livro infantil Ler para as crianças é uma boa forma de incentivar o gosto pela literatura desde a infância (Foto: Divulgação)
Gostou desse conteúdo? Compartilhe em suas redes!

Além de ser um reconhecimento e homenagem a Zumbi dos Palmares, um dos maiores líderes negros do Brasil, morto em 1695 na luta pela libertação do povo contra o sistema escravista junto com seus companheiros de quilombo, o Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro, é uma data significativa para toda a sociedade brasileira ao trazer à luz questões relevantes e recorrentemente discutidas, como o racismo e a desigualdade.

Ainda há urgência em falar sobre a inserção do negro na sociedade brasileira, refletir sobre as violências e desigualdades sociais que a população negra sofre até hoje e discutir sobre questões importantes que precisam ser resolvidas, como racismo estrutural, discriminação, apropriação cultural, intolerância religiosa, falta de representatividade em lideranças, entre incontáveis outras opressões.

Para ajudar a difundir mais conhecimento sobre estes tópicos, nada melhor do que uma boa leitura.  Com o objetivo de valorizar a cultura negra, instigar o debate sobre questões raciais e promover representatividade, as editoras Ática e Caramelo selecionaram cinco livros para abordar a temática para crianças e jovens de forma lúdica. Reunindo autores renomados e obras contempladas com premiações, a seleção vai desde histórias para leitores iniciantes, de 4 a 5 anos, a leitores autônomos, a partir dos 10 anos.

Especialistas do Clube de Autores, uma plataforma de autopublicação, selecionaram cinco livros que trazem visibilidade e entendimento sobre o assunto para os adultos. A Editora Paulínia apresenta alguns títulos que retrataram a representatividade negra. Já a Editora Mundo Cristão lança no Brasil ‘Uma leitura negra’, do escritor e teólogo afro-americano Esau McCaulley.

Confira a seleção preparada por ‘Ler Faz Bem’.

Benedito

Assim como todos os bebês, Benedito vai descobrindo o mundo por meio de todos os sentidos. A partir das texturas, dos sons, das imagens, dos aromas, dos sabores e, principalmente, das interações afetivas com adultos e crianças, eles vão – pouco a pouco – construindo seus conhecimentos sobre a realidade que os cerca.

Benedito, por exemplo, descobre a batida do tambor do Congado e, à medida que experimenta, se apropria da cultura e desta memória ancestral. Nesse livro-imagem, Josias Marinho, portanto, nos apresenta as descobertas de Benedito sobre pertencimento, cultura e identidade.

No dia 24/11, das 9h30 às 10h45, o autor Josias Marinho irá participar da live “Ciranda dos Autores”, um bate-papo organizado pela Flipinha 2021, programa educativo da Festa Literária Internacional de Paraty (Flip). Com o tema central da programação abordando identidades, saberes e cosmogonias dos povos originários e comunidades tradicionais, o autor irá falar sobre a ancestralidade e manutenção do saber que vem da cultura negra e que está presente em “Benedito”. A conversa será transmitida ao vivo pelos canais do festival.

Princesa Arabela e um museu só pra ela

A princesa Arabela e seus amigos vão ao Museu Arabela, onde encontram obras impressionantes. Mylo Freeman, escritora e ilustradora holandesa, leva Arabela e seus leitores a um passeio por obras de arte clássicas e contemporâneas, tão fascinantes para as crianças quanto são para os adultos.

A história faz parte da coleção Giramundo, que reúne autores e ilustradores de várias partes do mundo, concebidas para crianças pequenas, e abordam de forma delicada questões importantes como amizade, respeito às diferenças e equilíbrio emocional, sempre com belas ilustrações.

Princesa Arabela vira irmã mais velha

A princesa Arabela brinca sozinha quase o tempo todo. Ela ia gostar de ter um irmãozinho ou uma irmãzinha para ter com quem brincar. Até que um dia Arabela recebe uma surpresa dos pais. Uma história divertida sobre escolhas que não são escolhas e sobre pequenas chateações que também podem ser alegrias. O livro foi escrito pela holandesa Mylo Freeman, que vive a vida criando ilustrações para revistas e livros infantis.

Batalha!

A obra conta as histórias de dois jovens periféricos engajados com a cultura hip-hop, o slam e os desafios da adolescência. Ao longo dos capítulos, o leitor é envolvido pelo cotidiano da crew, composta por grafiteiros, MCs, b-girls e DJs, e pela batalha contra o racismo, a opressão policial e a desigualdade social, pois é colocado em contato com a organização de festas de rua, o intercâmbio entre diferentes bairros, o amadurecimento artístico e pessoal de cada personagem, as relações com a comunidade, a repressão policial e o perigo iminente do tráfico.

Esse livro foi escrito por Tânia Alexandre Martinelli, autora de mais de quarenta títulos publicados e ganhadora do selo Distinção do Prêmio Cátedra Unesco de Leitura, da PUC-Rio, e o de Melhor Livro Juvenil da AEILIJ (Associação dos Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil); e escrito por Valdir Bernardes Jr. ativista do movimento hip-hop há mais de vinte anos, que assina produções de rappers locais e nacionais, e desenvolve e apoia ações sociais e culturais, como arte educador, nas comunidades de Florianópolis.

Quarto de Despejo: diário de uma favelada

“Gosto de manusear um livro. O livro é a melhor invenção do homem”. A frase da autora Carolina Maria de Jesus está presente no clássico brasileiro Quarto de Despejo: diário de uma favelada, que em 2020 completou 60 anos. Em comemoração ao aniversário da obra, a Editora Ática criou uma edição especial, juntamente com a publicação inédita da adaptação para o teatro escrita por Edy Lima. Em 2021, as duas obras foram contempladas com o selo “Altamente Recomendável” pela Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil (FNLIJ).

A partir de registros pessoais de sua autora, Carolina Maria de Jesus, que narra seu cotidiano cercado por miséria, violência e fome, o livro contempla sua perspectiva sobre as desigualdades de classe, gênero e raça, advinda do dia a dia como catadora de papel na favela do Canindé, em São Paulo.

Seu olhar único é o responsável por desnudar as raízes do preconceito e da injustiça social no Brasil. Por isso, mesmo sendo escrito na década de 1950, a obra nunca perde sua atualidade e adiciona riqueza e humanidade a temas de extrema relevância, enquanto expõe o processo de auto-estruturação de comunidades periféricas.

Em um país onde a população negra ainda busca referências culturais e históricas e onde os currículos escolares ainda não mostram, de forma adequada, a representatividade das origens africanas de uma população que é maioria no Brasil, o selo Saberes e Letras apresenta um livro infantil que exalta a beleza do cabelo de uma menina negra. O selo pertence à Paulinas Editora, que oferece vários livros cujos personagens principais são negros e com contos de origem africana.

‘Cabelindo’ destaca o orgulho dos cabelos afro

“Cabelindo”, de Lilyan Teles, com ilustrações de Rubem Filho, é uma obra que  apresenta, em forma de poesia, o encantamento de uma menina com as inúmeras possibilidades e descobertas que seu cabelo lhe proporciona, sempre chegando a uma só conclusão: seu cabelo é bonito! O livro tem um poder enorme ao reafirmar a autoestima de milhões de meninas negras que, muitas vezes, sofrem preconceito por seus cabelos crespos.

Outro lançamento da Paulinas Editora é “O espanta-moscas”, de Rogério Andrade Barbosa, que trouxe um conto do povo Ashanti, de Gana, na África, sobre uma princesa que não consegue decidir com quem se casar. Além de ser um conto africano originário, é importante para a população negra do Brasil, pois mostra que sua origem não são “os escravos”, mas sim um povo altivo, com reis, rainhas, príncipes e princesas, que foi escravizado.

Sobre representatividade, a Paulinas Editora oferece, também, o livro “Pretinha de Neve e os sete gigantes”, que, subvertendo o conto original, tem uma protagonista negra, em um reino na África. No mês da Consciência Negra, a Paulinas acredita que oferecer livros com histórias sobre a África, representatividade e orgulho, principalmente para os leitores infantojuvenis, cria, como diz a premiada escritora Conceição Evaristo, “uma semântica de positividade por meio da literatura”. Veja mais no site paulinas.com.br.

Livros discutem racismo estrutural no mundo adulto

Vidas Negras

Nesta ficção, Antonio Auggusto João conta a história de três personagens, um médico, uma aeromoça e um jogador de futebol, que sofrem a vida inteira com o racismo e se encontram em uma tragédia onde o caráter e competência de cada um consegue vencer todo preconceito. O enredo traz uma importante reflexão sobre o preconceito, pois apesar de ser uma obra fictícia, os dramas vividos pelos personagens são os mesmos enfrentados diariamente por muitos na vida real.

O preconceito racial no Brasil

Com uma retrospectiva histórica, desde o período pós abolição, o livro de Ronildo Neumann Pastoriza busca responder questões importantes sobre como a realidade dos negros no País foi construída a partir da libertação dos escravizados. Com isso, leva ao leitor uma visão crítica dos anos de sofrimento e invisibilidade do povo negro, que tanto contribuiu na formação da sociedade e da cultura brasileira.

 

Mulheres Negras

Escrito por Adeildo Vila Nova e Edjan Alves dos Santos, o livro discute a questão de gênero na sociedade brasileira, especialmente no que se refere às mulheres negras. Por meio de pesquisas e entrevistas, é  apresentado um debate sobre as barreiras encontradas por oito mulheres negras trabalhadoras, de origem pobre que conseguiram ocupar lugares de destaque no campo profissional e político. Oferece um mergulho na vivência, estratégias de sobrevivência e de transposição das barreiras que elas encontraram durante o decorrer de suas vidas.

Aquilombamento Digital

A obra de Gabriel Santana e Boni Sobrinho aborda sobre a importância da referência para a construção da identidade social e/ou da reconfiguração de seus comportamentos na atualidade. Apresenta o efeito de dinâmicas associadas ao acesso às influenciadoras digitais afrobrasileiras no aprendizado de novos padrões éticos e estéticos, por jovens, negras e negros.

 

Branquitude, Música Rap e Educação

O autor, ativista e pesquisador negro Jorge Hilton se aventurou no território musical, expondo e analisando a tensão racial existente. A obra ‘Branquitude. Música Rap e Educação – Compreenda de uma vez o racismo no Brasil a partir da visão de rappers brancos, busca trazer reflexões sob diversos pontos de vista. O que eles e elas pensam sobre relações raciais e racismo?

A autodeclaração racial que fazem, condiz com seus olhares de como a sociedade os percebe racialmente? Quais suas visões sobre privilégio branco? Conclui discutindo o papel da educação racial na mudança de pensamentos e atitudes, educação pela abolição do racismo, como processo fomentador da alteridade, sociabilidade e respeito às diferenças.

‘Uma leitura negra’: a valorização da rica herança da igreja negra

Criado no Sul dos Estados Unidos, o escritor e teólogo afro-americano Esau McCaulley conheceu de perto a luta de muitos de seus descendentes pela igualdade em todos os setores da sociedade. Importante voz na pauta antirracista, o autor elucida em Uma leitura negra uma realidade que também pode ser aplicada ao Brasil: o sofrimento causado pela desvalorização e exclusão de toda uma comunidade.

O livro – que pretende se tornar o “resgate da esperança para aqueles que sofrem as consequências do racismo” – causou enorme impacto na igreja evangélica norte-americana e acaba de chegar ao Brasil pela Editora Mundo Cristão. Pautas como etnia, escravidão, protestos políticos e policiamento são trabalhados a partir de um eloquente testemunho pessoal, com sensibilidade e rigor acadêmico.

Na obra, McCaulley propõe um modelo de interpretação bíblica a partir da valorização do legado das igrejas negras tradicionais. Em um momento em que alguns dentro da comunidade afro-americana estão questionando o lugar da fé cristã na luta pela justiça, McCaulley argumenta que ler as Escrituras a partir da perspectiva da tradição da igreja negra é inestimável para se conectar com uma rica história de fé, abordando questões urgentes de nosso tempo.

Tendo como elemento central o resgate da esperança para aqueles que sofrem as consequências do racismo, Uma leitura negra propõe a prática da leitura da Bíblia e de sua interpretação a partir da rica herança da igreja negra, ou da “interpretação eclesiástica negra”, como denomina o autor. O caminho apontado por Uma leitura negra não poderia ser diferente: o diálogo multiétnico para a comunhão entre homens e mulheres criados à imagem e semelhança de Deus.

Esau McCaulley constrói sua argumentação aliando elementos que por vezes parecem inconciliáveis: uma sólida argumentação baseada na ortodoxia bíblica e um forte apelo étnico e social. Nesse particular, as perspectivas bíblica e negra se encontram para dar respostas divinas ao sofrimento de toda uma comunidade. Sensível, Esau aponta o caminho do diálogo multiétnico para a comunhão entre homens e mulheres criados à imagem e semelhança de Deus.

Laurentino Gomes, jornalista, escritor e um dos mais prestigiados estudiosos da escravidão no Brasil, endossa o lançamento da obra no país, que considera um livro de interesse de pessoas negras e cristãs.

“É uma obra fundamental para entender a ideologia escravista, suas consequências no mundo de hoje, e o quanto a mensagem das Sagradas Escrituras e do evangelho foi manipulada e distorcida para justificar a opressão, a morte e o sacrifício de milhões de negros escravizados. Mais do que um ajuste de contas com o passado, o livro oferece a oportunidade de remissão e de reencontro dessa mensagem com as necessidades mais profundas de amor, acolhimento e misericórdia. Leitura obrigatória para todos os brasileiros, independentemente da cor da pele e de suas origens étnicas e culturais”, diz o pesquisador.


Sobre o autor

Esau é mestre em Teologia pelo Gordon Conwell Theological Seminary e doutor em Novo Testamento pela University of St. Andrews. Atualmente, exerce a função de professor assistente de Novo Testamento no Wheaton College, em Illinois, e é apresentador do podcast Disrupters. É colaborador de opinião no The New York Time e autor de numerosos artigos em veículos como Christianity Today, The Witness e The Washington Post. Esau é casado com Mandy, com quem tem quatro filhos.

Ficha técnica:
Livro: Uma leitura negra
Autor: Esau McCaulley
Editora: Mundo Cristão
Páginas: 192
Preço: R$ 59,90
Onde comprar: Amazon e Mundo Cristão

Com Assessorias

 

 

Gostou desse conteúdo? Compartilhe em suas redes!

You may like

In the news
Leia Mais
× Fale com o ViDA!