Espera por diagnóstico do câncer representa mais custos e riscos de morte

Entidade que organiza Outubro Rosa afirma que Lei dos 30 Dias não está sendo cumprida, o que prejudica o tratamento de pacientes

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O câncer é uma doença de rápida evolução e que não faz quarentena nem jogo político. Os riscos de morte são maiores e os custos, muito mais altos quando os casos chegam em estágios avançados. Mas no Brasil, os pacientes com câncer estão sendo negligenciados no Brasil, sem orientação do Ministério da Saúde para estados e municípios aplicarem a Lei dos 30 Dias, que estabelece que exames para a confirmação do diagnóstico de câncer devam ser realizados em até um mês.

O alerta é da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama (Femama), responsável pela campanha Outubro Rosa, ao denunciar que as leis não são cumpridas e as taxas de mortalidade na Oncologia continuam altas. Um levantamento mostrou que no Rio de Janeiro (RJ), o tempo médio para realização da biópsia até a disponibilização do resultado é de 29 a 35 dias.

Porto Alegre (RS) alega que a consulta é marcada antes dos 30 dias, mas o que a lei deveria contemplar é todo o período até o diagnóstico, não só o da consulta nem só o do resultado. Já Criciúma (SC) é um exemplo de município que alegou que não há demanda reprimida, filas ou que prazo máximo está sendo respeitado.

Paciente catarinense teve que ir para o RS: demora já chega a 60 dias

No entanto, o caso de uma paciente atendida por uma ONG local, associada da Femama, mostra o contrário. A mulher está há quase um mês tentando, sem sucesso, agendar sua consulta com mastologista após uma mamografia que identificou um nódulo.

A justificativa do momento é o coronavírus. Nesse meio tempo, ela se mudou para Bento Gonçalves (RS) e, lá, saiu com uma consulta agendada para duas semanas depois, no SUS. Todo o processo já ultrapassou 60 dias, o dobro do que é previsto em lei para os pacientes de câncer.

Se essa situação não for combatida, tanto os governos estaduais e municipais como o federal serão responsabilizados por essas vítimas. Pacientes não podem esperar o jogo político ficar mais ameno para cuidar de si e tratar do câncer”, afirma Maira Caleffi, mastologista e presidente voluntária da Femama, ao cobrar do poder público a garantia dos direitos de pacientes.

Antes da pandemia, demora já chegava a 200 dias, diz TCU

A Lei dos 30 Dias tem como objetivo garantir o diagnóstico precoce, o que aumenta as chances de cura e de a doença nunca mais voltar, além de diminuir o impacto na gestão de pacientes oncológicos, com menos tratamentos, gastos e processos judiciais. Mesmo antes da pandemia, a auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) apontou espera de até 200 dias para o diagnóstico de câncer, quase sete vezes mais do que a lei garante ao paciente.

Segundo publicação do Diário Oficial, a regulamentação da Lei dos 30 Dias deveria ser feita pelo Ministério da Saúde até 28 de abril, o que nunca aconteceu. A justificativa foi o coronavírus. Ao ser questionado pela Femama, o Ministério respondeu que já era subentendido que a lei estaria regulamentada por portarias anteriores, como a que institui a Política Nacional de Prevenção e Controle do Câncer, e que a responsabilidade era, agora, dos estados e municípios.

Isso realmente é verdade, mas vale reforçar que é responsabilidade do Ministério da Saúde dar direcionamento para que os níveis regionais de poder possam ter uma atuação unificada e garantam aos cidadãos seus direitos ao diagnóstico e tratamento do câncer de forma precoce. Nenhuma das portarias mencionadas pelo Governo Federal, por exemplo, versa sobre um prazo de 30 dias”, explicou a dra Maíra.

Ainda segundo a Femama, a falta dessa orientação deixa dúvidas cruciais como em que parte da jornada do paciente começa e onde termina o prazo dos 30 dias; quem fica responsável pelo registro, notificação, fiscalização e monitoramento da lei. Ou mesmo qual é o sistema que unificará e quando ele entrará em operação. Isso tudo inviabiliza a aplicação da lei no sistema público de saúde.

Levantamento com estados e municípios mostra despreparo

A realidade é que pacientes esperam por muito tempo para fazer exames e biópsias e os gestores insistem em dizer que não há fila de espera. Essa incongruência veio à tona com o questionamento formal feito pela Femama estados e municípios por meio da Lei de Acesso à Informação (LAI) após a terceirização de responsabilidade pelo Ministério da Saúde.

O resultado, decepcionante, já era esperado por conta do relato de muitos pacientes: há um despreparo das instâncias regionais de poder, que não sabem como implementar a lei, apesar de terem ciência da responsabilidade que lhes foi repassada e da necessidade de diminuir a espera dos pacientes com queixas suspeitas de câncer”, afirma a mastologista.

Para entender o tamanho da desorganização, de acordo com ela, alguns não responderam dentro do prazo, de outros a resposta era vaga e prolixa, citando todos os esforços que realizam continuamente pelo bem de pacientes sem citar especificamente o que foi feito para se ter o diagnóstico precoce.

Ainda foram encontrados casos onde o site para registrar reclamações ficou sem funcionar por um período. Poucos realizaram esforços específicos para a Lei dos 30 Dias funcionar. A impressão que fica é que nada foi feito e pacientes continuam tendo que aguardar por meses por seu diagnóstico.

Menos da metade dos estados investe em melhorias

Entre os 17 estados respondentes, somente 47% disseram que estão investindo em melhorias administrativas, de processos e infraestrutura de acesso para atender a lei. A notícia positiva é que, além destes, dois estados (12%) apontaram ter criado um programa de navegação de pacientes – Ceará e Maranhão.

O levantamento também consultou diretamente 24 capitais, das quais 12 responderam. Quatro capitais afirmam estar atendendo no prazo de 30 dias – Belém, Fortaleza, Porto Alegre e São Paulo. Embora a maioria alegue que está fazendo o possível para aplicar o prazo correto da lei, quase 30% delas negam a responsabilidade, atribuindo-a ao estado.

Embora o estudo seja menos robusto, mostra o empurra-empurra que vem acontecendo. A Femama possui 70 ONGs associadas em todo Brasil e, ao consultá-las, foi possível identificar que as respostas de alguns dos entes federados discordam das situações relatadas por pacientes”, explica a presidente da Federação.

Alguns estados até mesmo dizem estar tentando “se virar”, cada um à sua maneira, já que não há um acordo ou investimento nacional partindo do Ministério da Saúde. A solução dada pela maioria dos estados e municípios é que, no caso de o prazo não ser cumprido, pacientes devem procurar a Unidade de Saúde em que foram atendidos e depois recorrerem às Ouvidorias dos Estados e do SUS.

Ou seja, um ciclo vicioso sem resolução e sem um mecanismo unificado de fiscalização de cumprimento. O sistema privado de saúde consegue oferecer diagnóstico e tratamento em um período muito inferior ao estabelecido, mas pacientes do SUS com suspeita de câncer têm uma jornada muito difícil, sem respaldo. Como resultado, a Covid-19 aumentou ainda mais a distância entre os pacientes oncológicos do sistema público e os da rede privada em relação à chance de cura do câncer.

Evento online gratuito debate iniciativas para melhoras tratamento

Uma das iniciativas para melhorar esse cenário é o City Cancer Challenge, uma iniciativa mundial e que, no Brasil, é aplicada em Porto Alegre, com ajuda da Femama. A entidade participa dia 23 de setembro, das 16h às 17h20, de um painel no 7º Congresso Todos Juntos Contra o Câncer (TJCC) sobre a mobilização para a qualidade no cuidado do câncer. O evento será online e a inscrição pode ser feita no site https://congresso.tjcc.com.br.

Da Femama, com Redação

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