Ao contrário do que ainda pensa muita gente, os macacos não transmitem a febre amarela silvestre para os humanos. Eles também são vítimas. E ainda são nossos sentinelas grátis! Ao receber a picada de um mosquito infectado na floresta, eles adoecem e, muitas vezes, morrem, indicando para os humanos que ali naquele local o vírus está circulando. “Em outros países, eles compram animais para fazer testes (para verificar a presença do vírus). Aqui temos de graça, mas estamos exterminando”, alerta Ricardo Lourenço, pesquisador do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz). Apenas este ano, 325 macacos morreram no Estado do Rio de Janeiro, em 53,5% dos casos, vítimas de agressão humana, por pedradas, pauladas e envenenamento.
Em oficina sobre febre amarela para jornalistas na sede da Fiocruz, nesta quinta-feira (1/3), Lourenço deu uma verdadeira aula sobre o importante papel dos macacos para ajudar as autoridades sanitárias a conter o avanço da epidemia de febre amarela na Região Sudeste, especialmente no Rio de Janeiro, onde 108 casos já foram confirmados e 48 morreram somente este ano. Chefe do Laboratório de Mosquitos Transmissores de Hematozoários do IOC, ele participa da mesa redonda ‘A febre amarela do ponto de vista dos macacos’, que o Centro de Estudos do IOC/Fiocruz promove nesta sexta-feira (2/3), às 10h, no campus da Fiocruz, em Manguinhos (RJ), para esclarecer o papel dos macacos no ciclo da doença.
Matança de macacos desvia atenção e desperdiça recursos
Em nota, a Fiocruz explica que o óbito de macacos vítimas da febre amarela é um dos principais indícios de circulação do vírus em determinada área de mata ou floresta. Os mosquitos dos gêneros Haemagogus e Sabethes são os responsáveis pela transmissão do vírus nas áreas silvestres, enquanto, nas cidades, o Aedes aegypti, vetor da dengue, Zika e chikungunya, tem potencial de transmissão. No entanto, desde o início do surto de febre amarela no país, dezenas de primatas foram assassinados.
Além de ser crime ambiental, essa atitude sobrecarrega os laboratórios de diagnóstico que examinam casos para descartar a possibilidade de infecção por febre amarela. “Não matar macaco é importante. A maioria dos agressores deixa o animal onde está e os pesquisadores têm que recolher para fazer estudo, o que gasta tempo e material”, afirma Lourenço. Segundo ele, além de desviar a atenção dos pesquisadores, ao matar os macacos, aumenta-se também o risco de que mosquitos que transmitem a doença e costumam habitar a copa das florestas se desloquem mais para a periferia das matas, picando mais os humanos, já que as fêmeas precisam de sangue para ter seus filhotes.
O especialista também explicou que os macacos da espécie Bugio são os mais suscetíveis aos mosquitos que transmitem a febre amarela. “Eles são muito sensíveis e se deslocam no alto da floresta, mas o mosquito os alcança”, explica. Em seguida, vêm os saguis, uma espécie que vem se disseminando com muita velocidade. Já os macaco-pregos são mais resistentes ao vírus da febre amarela. Outras doenças também podem atingir os macacos, como herpes e toxicoplasmose, confundindo com os sintomas da FA, daí a importância de fazer os testes para confirmar a epizootia (epidemia entre os primatas). Ainda segundo ele, macacos são suscetíveis a lesões hepáticas semelhantes às que humanos sofrem com o agravamento da febre amarela.
Especialista orienta sobre o que fazer quando encontrar um macaco morto
Sobre a mesa redonda
A mesa redonda ‘A febre amarela do ponto de vista dos macacos’, que acontece nesta sexta-feira, no campus da Fiocruz, em Manguinhos (Av. Brasil, 4.365, RJ) tem a presença de Leandro Jerusalinsky, coordenador do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Primatas Brasileiros (CPB), do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), e presidente do conselho da Sociedade Brasileira de Primatologia (SBPr); e Sergio Lucena Mendes, professor da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), diretor do Instituto Nacional da Mata Atlântica (INMA) e membro da Sociedade Brasileira de Mastozoologia (SBMz).
A iniciativa é moderada pelo pesquisador Paulo Sérgio D´Andrea, do Laboratório de Biologia e Parasitologia de Mamíferos Silvestres Reservatórios do IOC e presidente da SBMz. A iniciativa conta com a parceria das Sociedades Brasileiras de Mastozoologia (SBMz) e Primatologia (SBPR). Acompanhe ao vivo clicando aqui. Em caso de dúvidas, acesse a página de ajuda.