Veneno de cobra poderia inibir coronavírus, diz pesquisa

Pesquisadores da Unesp apontam que proteína contida no veneno da cobra jararacuçu seria eficiente para combater a reprodução do Sars-Cov-2

Pesquisadores estudaram proteínas do veneno da cobra jararacuçu (Foto: Miguel Nema/Parque Estadual Serra do Mar)
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Na ‘linha de frente’ para encontrar a cura para a Covid-19, doença que já ceifou mais de 580 mil vidas no país, cientistas brasileiros estão apostando em diversos estudos com animais que potencialmente teriam a chance de combater a doença e seus efeitos. Depois da pesquisa com plasma de cavalos, feita pelo Instituto Butantan, de São Paulo, para desenvolver um soro capaz de tratar os sintomas da Covid-19, agora pesquisadores do Instituto de Química (IQ) da Universidade Estadual Paulista (Unesp), apontam que o veneno de cobra poderia inibir a reprodução do coronavírus.

Mas não se trata de qualquer cobra e sim da espécie brasileira jararacuçu, que, segundo os pesquisadores, contém uma peptídeo (pedaço de proteína) capaz de combater o Sars-Cov2. A descoberta realizada na cidade de Araraquara (SP) – a mesma que realizou um lockdown total e conseguiu frear a pandemia do coronavírus – ocorreu após testes realizados em laboratório, nos quais os pesquisadores observaram que a molécula extraída do veneno do réptil inibiu em 75% a capacidade do vírus se multiplicar em células de macaco. Os resultados obtidos no trabalho foram publicados em um artigo na revista científica internacional Molecules.

A eficiência do peptídeo foi testada no Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), onde uma amostra do coronavírus está isolada. O estudo preliminar apresenta um caminho promissor na busca por medicamentos para tratar pacientes contaminados pela Covid-19. O grande desafio para a criação de um novo fármaco é garantir que ele seja eficiente contra determinada patologia e, ao mesmo tempo, não gere reações adversas para quem for tomá-lo.

Os resultados obtidos nos ensaios iniciai foram animadores, segundo Eduardo Maffud Cilli, professor do IQ e um dos autores do trabalho “Nós encontramos um peptídeo que não é tóxico para as células, mas que inibe a replicação do vírus. Com isso, se o composto virar um remédio no futuro, o organismo ganharia tempo para agir e criar os anticorpos necessários, já que o vírus estaria com sua velocidade de infecção comprometida e não avançaria no organismo”, disse ao G1.

Veneno de cobra: como o peptídeo atua?

Peptídeo que foi sintetizado no IQ e inibe a replicação do SARS-CoV-2 — Foto: Eduardo Cilli

Peptídeo que foi sintetizado no IQ e inibe a replicação do SARS-CoV-2 — Foto: Eduardo Cilli

O peptídeo encontrado na jararacuçu é uma molécula que interage e bloqueia a PLPro, uma das enzimas do novo coronavírus responsáveis por sua multiplicação nas células.

De acordo com o docente do IQ, esse mecanismo de ação é interessante porque todas as variantes do SARS-CoV-2 possuem a PLPro, então a tendência é de que a molécula do réptil mantenha sua eficácia contra diferentes mutações do vírus.

Embora diversas vacinas tenham sido aprovadas recentemente, a imunização completa da população mundial ainda levará tempo, o que, junto com o surgimento de novas variantes, reforça a importância da procura por tratamentos eficazes.

Veneno da serpente

Pesquisadores observaram que a molécula extraída do veneno de cobra inibiu em 75% a capacidade do vírus se multiplicar em células de macaco — Foto: Paulo Chiari/EPTV

Molécula extraída do veneno de cobra inibiu em 75% a capacidade do vírus se multiplicar em células de macaco — Foto: Paulo Chiari/EPTV

A ideia de investigar o potencial do veneno da serpente contra o novo coronavírus surgiu quando, recentemente, cientistas do Instituto de Química da Unesp descobriram que o peptídeo da cobra tinha atividade antibacteriana, o que os motivou a realizar novos testes para avaliar se ele também poderia agir em partículas virais.

Inicialmente, os efeitos não foram tão elevados, mas após algumas pequenas modificações na estrutura química da molécula sintetizada no IQ, sua atividade antiviral começou a aumentar até inibir 75% da capacidade do vírus se multiplicar nas células.

Testes

Resumidamente, o ensaio é feito da seguinte forma: células de macaco cultivadas em laboratório recebem o peptídeo e, após uma hora, o vírus é adicionado na cultura.

Passados dois dias, os pesquisadores avaliam os resultados e, por meio de alguns cálculos, descobrem o quanto o vírus deixou de se reproduzir. Isso é possível porque os estudiosos já sabem previamente qual seria a multiplicação do vírus em condições normais, ou seja, se ele estivesse em contato apenas com as células.

Em uma segunda etapa do estudo, na qual os pesquisadores identificaram um dos mecanismos de ação do peptídeo da cobra, o composto foi testado especificamente contra a enzima PLPro, que foi obtida no Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP.

Próximos passos

Nos próximos passos do estudo os pesquisadores irão avaliar a eficiência de diferentes dosagens da molécula — Foto: Paulo Chiari/EPTV

Nos próximos passos do estudo os pesquisadores irão avaliar a eficiência de diferentes dosagens da molécula — Foto: Paulo Chiari/EPTV

Nos próximos passos do estudo os especialistas irão avaliar a eficiência de diferentes dosagens da molécula, bem como se ela pode exercer outras funções na célula, como a de proteção, evitando até mesmo que o vírus a invada. Após o fim desses testes, o objetivo é que a pesquisa avance para a etapa pré-clínica, em que será estudada a eficácia do peptídeo para tratar animais infectados pelo novo coronavírus.

A pesquisa foi financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Além do professor Cilli, fizeram parte do estudo pelo IQ os cientistas Paulo Sanches, Natália Bitencourt e Norival Santos Filho. O trabalho contou ainda com a participação de pesquisadores do ICB, IFSC, da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp).

Fonte: G1, com Redação

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