Cedae garante que excesso de algas não causa problemas à saúde

Companhia vai aplicar carvão ativado pulverizado para conter fenômeno da geosmina na água. Especialistas alertam para limpeza de filtros e reservatórios

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A semana no Rio de Janeiro foi dominada pelo noticiário de que a água que abastece a Região Metropolitana estaria contaminada e muitos relatos de pessoas que teriam passado mal após a ingestão, com sintomas como diarreia e vômitos. Desde o início de janeiro, moradores das zonas Norte e Oeste descrevem uma água muitas vezes turva, com cheiro forte e gosto de terra saindo das torneiras e filtros.

Em nota, a Cedae, empresa responsável pelo abastecimento em boa parte do estado, atribuiu o problema à presença da geosmina, produzida e liberada pelo excesso de algas no Rio Guandu, de onde é captada a água que abastece a Região Metropolitana. E garante que a substância não apresenta risco à saúde e pode ser consumida pela população.

Mesmo garantindo que a água está dentro dos padrões do Ministério da Saúde, a Cedae anunciou que passará a adotar, “em caráter permanente, a aplicação de carvão ativado pulverizado no início do tratamento”, com objetivo de reter a geosmina, caso esse fenômeno volte a ocorrer.

Em nova nota, a empresa informa ainda que o método já vem sendo utilizado por outros estados, onde o problema tem maior recorrência. “A última vez em que a Cedae identificou a presença de geosmina na água foi em 2004 e, à época, avaliou-se que não seria necessário adotar medida semelhante”, descreve a nota. Casos semelhantes ocorreram também em São Paulo, em 2008, e em municípios dos estados da Paraíba e do Rio Grande do Sul em 2018, segundo a empresa.

Fake news faz aumentar venda de água mineral

As queixas viralizaram nas redes sociais e nos aplicativos de conversa em celular, tornando-se um prato cheio para outra praga que contamina a sociedade: a onda de fake news. Uma delas envolvia o Hospital Samaritano, que veio a público desmentir mensagem que está circulando na Internet sobre uma suposta recomendação médica para que a população não consuma água da torneira ou de filtro.

A mensagem dizia que a companhia teria emitido um alerta “urgente” enviado em um grupo de médicos da rede para que a população só utilize água “fervida e mineral de marca boa”.  O pânico fez a venda de água mineral nos supermercados e depósitos de bebidas do Rio de Janeiro e Região Metropolitana disparar, incrementada também pelo forte calor dos últimos dias, quando a sensação térmica no Rio chegou a bater 48 graus.

Para a pediatra  Lilian Cristina, a água turva que sai das torneiras dos cariocas pode causar uma série de problemas, entre elas a diarreia, que atinge grande parte das pessoas que em algum momento fez a ingestão da água. “As crianças são as mais afetadas pelo problema por estarem em fase de crescimento, apresentando quadros mais evoluídos da doença. Além disso, a diarreia é a maior causa de morte entre crianças com menos de cinco anos, de acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde)”, alerta.
As doenças mais comuns ligadas à contaminação da água são a gastroenterite, verminoses e doenças de pele. A Secretaria Estadual de Saúde chegou a informar que os casos de diarreia e vômitos (de origem infecciosa ou não) dobraram em duas unidades de pronto atendimento da Zona Oeste. Já a Secretaria Municipal de Saúde afirmou apenas que “pacientes com diversas doenças podem apresentar diarreia e vômito e que a percepção de aumento de casos de gastroenterite nessa época é normal, principalmente pelo consumo de alimentos mal armazenados”.

Vigilância Sanitária assegura potabilidade

A Subsecretaria de Vigilância Sanitária e Controle de Zoonoses do município Rio os índices encontrados nas primeiras amostras coletadas em 15 pontos da cidade atestam a potabilidade da água, de acordo com os parâmetros estabelecidos pelo Ministério da Saúde. O órgão concluiu, na tarde de quarta-feira, dia 8, a análise de 57 das 107 amostras da água de abastecimento distribuída pela Cedae, coletadas nos últimos dois dias em 15 bairros da cidade por técnicos do Laboratório Municipal de Saúde Pública (Lasp). “Os primeiros laudos são satisfatórios para turbidez, cloro, flúor, pH, coliformes totais e Escherichia coli”, informou a Subsecretaria, em nota.

Já o engenheiro civil e professor do IBMR Júlio César da Silva,  chefe do Departamento de Engenharia Sanitária e do Meio Ambiente da UERJ, contesta a versão da Cedae. Em nota enviada ao ViDA & Ação, ele afirma que “o excesso de algas é proveniente de excesso de fósforo e nitrogênio na água chamado eutrofização” e que “este excesso pode ser de vazamentos de detergentes e produtos químicos (efluentes industriais) na água bruta”.

O processo de tratamento da Cedae falhou ao não verificar este excesso e alterar a dosagem no tratamento para evitar este problema na água tratada. Faltou checar a qualidade da água tratada antes de distribuir. Qualquer espécie química em excesso, fora dos padrões de potabilidade, é um contaminante. Pode não ser um problema grave, mas é um contaminante”, destaca.

Em nota publicada no  site da Uerj, outro professor do mesmo departamento, Gandhi Giordano, confirma. “Acredite na sua percepção. Coloque a água em um copo transparente e observe. Se ela possuir cor ou odor estranhos, não beba. Essa água não é potável”.

Pesquisador sobre controle da poluição e tratamento da água, ele também recomenda o uso de água mineral, por via das dúvidas. “Se você tem condições de comprar água mineral, dê preferência apenas ao seu consumo até que a situação ser normalizada. Em viagens ou lugares desconhecidos, a recomendação é confiar somente na água industrializada. “Dependendo do estado da água, até escovar os dentes pode conter riscos de contaminação”, alerta.

Limpeza de filtros e reservatórios – O especialista também aconselha a realizar limpeza constante nos reservatórios de água e nos filtros, com a troca de velas de carvão, para evitar contaminação por micro-organismos. “Higiene é fundamental. Nosso saneamento básico é deficiente. Trata-se também de uma questão de educação e participação das pessoas”, diz Giordano.

A médica-veterinária Roberta Ribeiro, coordenadora do Lasp, uma das unidades que funciona no Complexo Zona Norte da Vigilância, em São Cristóvão, também recomenda que seja providenciada a limpeza das caixas, cisternas e demais reservatórios, caso a água das torneiras internas, como as das residências, apresente cor turva, cheiro ou algum sabor. As orientações estão no site da Vigilância Sanitária.

Mais sobre os exames

De acordo com Roberta Ribeiro, a análise da possível presença de substâncias químicas, como a geosmina, cabe à Cedae. “Os primeiros resultados se referem às amostras coletadas na terça em pontos de redistribuição da água de oito bairros e atestam a potabilidade, o que nos compete avaliar”, disse ela.

Para chegar aos laudos, cada amostra passa por um processo de análise específico de 24 horas. Vale ressaltar que a equipe do Lasp monitora a qualidade da água de consumo por meio de um conjunto de ações rotineiras adotadas pelas autoridades de saúde pública, a partir de protocolos estabelecidos pelo Governo Federal.

Aqui no Rio, esta análise é feita mensalmente em 264 pontos de distribuição da rede de abastecimento, considerando todos os parâmetros de potabilidade. Este trabalho permite a Vigilância atuar na prevenção para que a água consumida pela população atenda ao padrão e às normas estabelecidas na legislação”,- explica Roberta.
Do total das amostras, 57 foram coletadas na terça, dia 7, nos bairros de Paciência, Santa Cruz, Campo Grande, Olaria, Ramos, Brás de Pina, Humaitá e São Cristóvão. Nesta quinta (9) deverão sair os laudos de outras 50 amostras que foram coletadas em pontos de Realengo, Centro, Copacabana, Bangu, Gávea, Ipanema e São Conrado.

ONG alerta para risco de ‘colapso hídrico’

O Movimento Baía Viva, fundado nos anos 1990, protocolou uma representação judicial nesta sexta-feira (dia 10 de Janeiro) solicitando providências da Procuradoria Geral da República (PGR) e do Ministério Público Estadual (Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente (GAEMA/MPRJ). Na denúncia o Baía Viva contesta a posição da Cedae sobre a origem natural da presença da substância geosmina.

A OnG pede que a Justiça responsabilizar criminalmente dirigentes da Cedae, dos órgãos ambientais (SEAS e INEA) e das agências reguladoras ANA e Agenersa (estadual) por “omissão, negligência e leniência diante da gravidade da situação de crise sanitária e para declarar estado de vulnerabilidade hídrica no Estado do Rio de Janeiro”. A denúncia afirma que somente após a atual crise hídrica, foi informado pela Cedae que a presença da substância Geosmina sequer é um dos parâmetros analisados no limitado processo de monitoramento adotado pela companhia.

Para Sérgio Ricardo, membro-fundador do Baía Viva, “há fortes evidências que este quadro de descaso e abandono, poderá levar o Rio de Janeiro à um futuro Colapso Hídrico. Os impactos socioambientais e prejuízos econômicos são incalculáveis no momento!”. No estudo inédito “CRISE DAS ÁGUAS no Estado do Rio de Janeiro” (2020), o Baía Viva utiliza dados recentes da ANA e do próprio INEA que indicam um aprofundamento da contaminação dos principais mananciais utilizados para o abastecimento público; assim como alerta para a intensa degradação das bacias hidrográficas.

“Nos últimos anos, o entorno da Baía de Guanabara se transformou num cemitério de obras inacabadas, o que tem agravado o sacrifício ambiental das baías de Guanabara e de Sepetiba, das lagoas costeiras da Barra da Tijuca, de Niterói e Maricá e dos rios que tem a função estratégica de garantir o abastecimento da população no presente e no futuro”, ressalta.

Com Assessorias

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