Seguindo os preceitos da Reforma Psiquiátrica Brasileira, nos últimos 28 anos, o município do Rio de Janeiro libertou dos manicômios mais de 4 mil pessoas, que tiveram a cidadania resgatada, voltando a viver com suas famílias ou em uma das 97 residências terapêuticas mantidas pela Prefeitura. Em 2021 e 2022, foram encerradas as internações nos dois últimos grandes hospícios da cidade, os institutos Nise da Silveira e Juliano Moreira.

Após o processo de desinstitucionalização de pacientes psiquiátricos, a Secretaria Municipal de Saúde (SMS-Rio) implementou uma rede de cuidados dos centros de atenção psicossocial e dos serviços residenciais terapêuticos (SRTs) como novo modelo assistencial. O tratamento dos últimos remanescentes dos dois principais hospícios públicos do Rio segue nos 33 centros de atenção psicossocial (CAPS) da cidade, que substituem as grades por terapias humanizadas, baseadas em respeito e empatia.

O Dia Nacional da Luta Antimanicomial (18 de maio) é um marco do movimento de reforma psiquiátrica e ressocialização do paciente com doença mental, iniciado em 1987 no Brasil. Tanto a data como todo o mês de maio colocam em evidência a importância do combate à intolerância com indivíduos que possuem psicopatologias que requerem tratamentos especiais, como por exemplo, a necessidade de hospitalização.

A data lembra um longo processo de conscientização e construção de um novo modelo de assistência psiquiátrica, que ao longo dos anos vem substituindo os hospícios, onde os doentes viviam presos, por um tratamento humanizado em que o paciente é reintegrado à sociedade e tem resgatada sua cidadania.

Essa data marca a luta pela cidadania e a possibilidade de vida fora do hospício para pessoas que foram privadas de liberdade por muitos anos. O lugar dessas pessoas é na sociedade e precisamos cuidar desses pacientes com liberdade, dignidade e em sua diversidade. Esta luta é de toda a sociedade, dos usuários, familiares e inclusive profissionais”, diz o superintendente de Saúde Mental da SMS-Rio, Hugo Fagundes.

Para marcar a data, usuários dos serviços de saúde mental, familiares e profissionais de saúde do Rio de Janeiro se reuniram na tarde desta quinta-feira (18), num grande ato na Carioca, no Centro da cidade. Além de lembrar antigas mobilizações, a iniciativa divulga outras recentes em torno do fechamento de manicômios e a formalização de novas legislações que defendem propostas cada vez mais humanitárias no tratamento desses pacientes. Entre elas, estão os hospitais psiquiátricos e, a longo prazo, as residências terapêuticas.

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Mas o que são residências terapêuticas e como se diferenciam dos hospitais psiquiátricos?

Antigos manicômios são substituídos por novo modelo. Conscientização sobre tratamento de transtornos mentais passa por abordagem mais humanizada

O Dia da Luta Antimanicomial traz à tona a importância de propostas cada vez mais humanitárias no tratamento de transtornos mentais, entre elas, as residências terapêuticas (RT) – lar para pacientes com doenças mentais crônicas que, por conta de suas condições, não podem viver sozinhas.

Com concepções completamente diferentes e complementares, esses estabelecimentos não se assemelham nem na formação da equipe necessária e tampouco na estrutura física do ambiente onde está localizado. As residências terapêuticas são dispositivos que podem ser acionados no momento da estabilidade do paciente.

Ao contrário dos hospitais psiquiátricos, as RTs podem servir como uma solução definitiva de moradia para os pacientes, onde os mesmos encontrarão afeto, convivência, suporte em todas as suas necessidades e ajuda para usufruir da máxima autonomia que seu quadro permitir.

Para Ariel Lipman, médico psiquiatra e diretor da Sig Residência Terapêutica”, a chave para entender a diferença entre hospitais psiquiátricos e residência terapêutica está na compreensão da diferença de cuidado na crise e no período de estabilidade.

Residência Terapêutica é alternativa para cuidado a pacientes com transtornos mentais

Pessoas que convivem com transtornos passam por enormes sofrimentos, preconceito e algumas vezes até abandono. No Brasil, é comum que hospitais psiquiátricos virem moradia desses pacientes por tempo indeterminado, indo contra o objetivo da internação.

Neste contexto, as residências terapêuticas foram pensadas como uma proposta de moradia, trazendo um novo olhar para a convivência com doenças psiquiátricas e um local para chamar de lar. “Essas residências são opções que podem ser acionadas no momento da estabilidade do paciente, ou seja, quando essa pessoa não estiver em crise”, explica o médico.

Segundo ele, mesmo no período da estabilidade, muitos pacientes precisam de cuidados, como controle da sua medicação, cuidados com alimentação, higiene, convivência, lazer, etc. Assim, as residências terapêuticas devem ser cogitadas quando o paciente está estabilizado de seus sintomas mais graves e uma solução mais definitiva se mostra necessária, na tentativa de prover a melhor vida possível e prevenir a reincidência das crises.

Muitas vezes as famílias não conseguem prover todo esse cuidado, por questão de falta de tempo, esgarçamento das relações ou até mesmo morte/envelhecimento das pessoas que proviam todo esse suporte. Portanto, as residências terapêuticas ocupam esse espaço de prover todas as necessidades dos portadores de doenças psiquiátricas crônicas”, explica.

É necessário entender que mesmo no período da estabilidade, muitos pacientes precisam de cuidados, como controle da sua medicação, cu alimentação, higiene, convivência e lazer”, completa o especialista.

RT é alternativa aos antigos manicômios

O pensamento de que moradores de Residências Terapêuticas tenham sido abandonados por familiares e amigos pode ser comum em um primeiro momento, mas não é verdadeiro, muito pelo contrário.

Procurar um lar para uma pessoa com um transtorno mental grave é uma forma de cuidar e garantir a segurança desse paciente, já que nas residências eles recebem atenção e tratamento especializado 24 horas por dia, algo que os familiares não conseguem oferecer”, explica o psiquiatra.

Assim como alguns procuram instituições de longe permanência (os antigos asilos) para idosos, por falta de tempo de dedicação integral ou falta de estrutura para os cuidados necessários, os familiares podem encontrar nas moradias a segurança de saber que seus parentes estão sendo assistidos por profissionais

Mas qual a alternativa para tratamento?

De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), um a cada quatro brasileiros sofrerá com algum transtorno mental, como ansiedade, depressão, transtorno bipolar, esquizofrenia e dependência química. Alguns deles são mais graves do que os outros e podem aparecer em níveis diferentes em cada indivíduo.

Ariel Lipman lembra que alguns transtornos são controlados apenas com terapia, outros com medicações. “Muitas doenças, quando tratadas de maneira correta, não tiram a autonomia de uma pessoa de morar sozinha, o que significa que não existe a necessidade de procurar uma RT. Por isso, cada caso é avaliado individualmente”, explica

Quando recorrer à internação psiquiátrica em hospital

Segundo ele, os hospitais psiquiátricos são dispositivos que devem ser acionados exclusivamente em situações de crise, em que o tratamento deve ser feito de forma intensiva, o acompanhamento médico e multidisciplinar deve ser feito com muito mais frequência e recursos devem ser usados para garantir que o paciente não coloque em risco a si e terceiros.

Momentos em que os pacientes estão com comportamento de risco e por isso precisam estar em um ambiente seguro e extremamente controlado. Neste caso não há um período determinado, que deve ser o menor período possível. “Internação em hospital psiquiátrico é para casos agudos, no momento de crise e devem ter uma curta duração”, explica Lipman.

Com Assessorias

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