Fiocruz: vacinas podem evitar novos surtos e epidemias

Brasil vive o retorno de doenças erradicadas, como sarampo, e teme a volta da poliomielite. Entenda o processo de produção das vacinas

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Do Portal Fiocruz

Ainda que as vacinas sejam disponibilizadas gratuitamente no Sistema Único de Saúde (SUS), as taxas de imunização vêm caindo de forma considerável, atingindo os níveis mais baixos dos últimos 30 anos. Com isso, as crianças acabam ficando mais suscetíveis a doenças que podem levar a sequelas e até à morte. Inclusive, o Brasil já vive o retorno de doenças erradicadas, como o sarampo, e teme pelo reaparecimento de outras, como a poliomielite. Considerando esse quadro, no Dia Nacional da Imunização (9/6), a Fiocruz reforça a importância da vacinação para preservar a saúde da população, bem como evitar surtos e epidemias.

A própria Fundação, além de produzir os imunizantes, atua no rígido controle da qualidade dos imunizantes distribuídos pelo Programa Nacional de Imunizações (PNI) a fim de garantir sua segurança e eficácia. Quem realiza esse trabalho de análise e controle da qualidade é o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz).

A coordenadora do Núcleo Técnico de Produtos Biológicos do Instituto (NT-PB), Maria Aparecida Boller, explica que o processo de controle da qualidade das vacinas começa primeiramente com a análise dos imunizantes pelo produtor. Em seguida, o PNI envia ao INCQS a documentação de cada etapa da produção e controle realizados, além de amostras para serem testadas.

“Do estudo clínico de uma nova vacina, até o produto final para a utilização na rede de saúde, são realizadas muitas etapas, todas monitoradas passo a passo, portanto as vacinas são seguras”, declara. Ela complementa ainda que antes da aprovação da vacina, os laboratórios produtores devem ser certificados com Boas Práticas de Fabricação, e os técnicos envolvidos no trabalho devem ser treinados em cada etapa do procedimento.

“Também são realizados testes de potência e estabilidade, entre outros, e um rigoroso controle para assegurar a segurança e eficácia da vacina para que ela proteja a população e mostre que a imunização traz mais benefícios do que riscos”.  Entretanto, como qualquer medicamento, a vacina pode trazer reações adversas – que são muito mais leves do que as doenças e seus possíveis danos à saúde.

Controle de qualidade no INCQS

Antes das vacinas serem distribuídas para os postos de saúde, o INCQS testa amostras de todos os lotes, enviadas pelo PNI. “São realizadas análises laboratoriais que devem seguir normas nacionais e internacionais”, destaca Boller. “Somente após a liberação das vacinas pelo INCQS, é que ocorre a distribuição para todo o País”.

O tempo para atestar a qualidade do imunizante dependerá do tipo de vacina e das análises laboratoriais recomendadas para cada produto, podendo variar de 5 a 90 dias. Mesmo depois dessa etapa, a qualidade do produto continua sendo avaliada sistematicamente, e o INCQS é consultado, caso haja alguma suspeita de problemas com a qualidade.

“Além disso, a autorização de uso de uma vacina deve, antes de ser aplicada, estar de acordo com pré-requisitos que garantam a segurança e eficácia, estabelecidos pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). O controle da qualidade é realizado para garantir que a segurança e eficácia das vacinas estão de acordo com esses pré-requisitos”, diz.

Queda vacinal: desafios

Considerados todos esses processos de validação e controle, a Fiocruz enfatiza que as vacinas são seguras e instrumento fundamental de saúde pública. Nos últimos 50 anos foram responsáveis por salvar mais vidas do que qualquer outro produto ou procedimento médico. Elas estimulam o corpo a se defender contra os organismos que provocam uma série de doenças graves e podem levar à morte ou deixar sequelas de longo prazo. Dessa forma, quando a pessoa é vacinada, seu corpo detecta o imunizante e produz anticorpos, que são a defesa natural do organismo. Esses anticorpos conferem imunidade contra uma futura infecção pelo agente causador da doença.

Os fatores que explicam a recente queda nas coberturas vacinais no Brasil são muitos, e vão desde as questões de logística, distribuição, transporte e acesso às vacinas por todo o País até a ação de movimentos antivacinas, que reduzem a adesão aos programas e campanhas. Em artigo publicado em 2019, a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, já alertava a respeito da necessidade de maior consciência social “diante de movimentos de resistência à vacinação que, além da atitude anticientífica, colocam em risco a saúde coletiva”.

Nesse sentido, em dezembro de 2021, o Instituto de Tecnologia em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos/Fiocruz) e a Secretaria de Vigilância e Saúde do Ministério da Saúde (SVS/MS) assinaram um protocolo de intenções para implementar o programa de Reconquista das Altas Coberturas Vacinais. O projeto estabelecerá uma rede de colaboração interinstitucional com atores de diversos setores com o objetivo de implementar ações de apoio estratégico ao PNI, a fim de reverter a trajetória de queda e assegurar o controle de doenças transmissíveis que podem ser controladas com o uso de vacinas.

Programa Nacional de Imunizações é um marco histórico na saúde pública brasileira

No mesmo ano em que conquistou a certificação internacional pela erradicação da varíola, em 1973, o Brasil deu outro passo marcante no âmbito da saúde pública. Foi nessa época que, por determinação do Ministério da Saúde, foi formulado o Programa Nacional de Imunizações (PNI), com o objetivo de coordenar e sistematizar as ações de vacinação. Até então, essas iniciativas se caracterizavam por um caráter episódico e por uma reduzida área de cobertura, segundo o historiador e pesquisador Carlos Fidelis da Ponte, do Departamento de Pesquisa em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz).

O PNI, que acabou sendo oficialmente lançado em 1975, foi resultante de um somatório de fatores, de âmbito nacional e internacional, que convergiram para estimular e expandir a utilização de imunizantes.

Dessa forma, o PNI passou a coordenar as atividades de vacinação desenvolvidas rotineiramente na rede pública e se tornou parte fundamental do Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecido pela Constituição de 1988. Além da prevenção de doenças, o PNI também contribuiu fortemente para o avanço do sistema de vigilância epidemiológica e para o controle de qualidade das vacinas oferecidas na rede, segundo o historiador.

Dias Nacionais de Imunização

O grande salto do Programa Nacional de Imunização aconteceu a partir de 1980, com a implementação dos Dias Nacionais da Vacinação como parte da estratégia para erradicar a poliomielite no Brasil. Marcado por um forte plano de comunicação, com a criação do personagem Zé Gotinha e apoio de celebridades, o planejamento alavancou as coberturas vacinais e levou a doença a ser considerada oficialmente eliminada do país em 1994. “O Dia D foi sucesso absoluto e provou que era possível conseguir vacinar a população-alvo de um país de dimensões continentais em um único dia”, resume o historiador da COC.

A Fiocruz forneceu, inclusive, uma importante contribuição no aperfeiçoamento da vacina contra a poliomielite. No início da década de 80, diante de uma epidemia no Nordeste, o Instituto de Bio-Manguinhos disponibilizou novas formulações de vacina monovalente tipo 3 e trivalente potencializada contra o tipo 3 do vírus, que passou a ser adotada pela OPAS e Organização Mundial de Saúde para todos os países de clima tropical. “Isso foi possível a partir de uma organização da Fundação no processo de transferência de tecnologia e o incentivo à fabricação nacional de vacinas”, afirma Fidelis da Ponte.

Assim como a Fiocruz, o PNI é parte fundamental do SUS e se consolida, até hoje, como um dos melhores exemplos de garantia de acesso universal e igualitário à saúde. A partir do programa, foi possível eliminar no Brasil outras doenças como rubéola, síndrome da rubéola congênita, tétano materno e neonatal, e o sarampo, de forma temporária; além de reduzir significativamente a incidência de importantes causas de adoecimento e mortalidade, como a difteria, as meningites bacterianas, a coqueluche, entre outras. Atualmente, o calendário de rotina do PNI contempla 48 imunobiológicos, entre vacinas, imunoglobulinas e soros.

“A saúde pública é uma área que só pode ser, verdadeira e efetivamente, tocada pelo Estado. O mercado é incompatível com a saúde pública. Verificamos isso no começo do século XX, na década de 1970 com a meningite, mais tarde com a Aids e hoje com a covid-19”, salienta o historiador.

A Fiocruz e o PNI

O programa define as demandas de imunobiológicos considerando o atendimento ao Calendário Nacional de Vacinação e outras ações estabelecidas de acordo com a situação epidemiológica do país. Unidade produtora de imunobiológicos da Fiocruz, Bio-Manguinhos tem função primordial no fornecimento desses imunizantes. Das 13 vacinas contempladas no calendário infantil, sete são fornecidas pelo instituto: febre amarela, pneumocócica 10-valente, poliomielite inativada, poliomielite oral, rotavírus, tríplice viral (sarampo, caxumba e rubéola) e tetravalente viral (sarampo, caxumba, rubéola e varicela).

As vacinas demandadas pelo PNI são produzidas em Bio-Manguinhos dentro dos mais rigorosos padrões de qualidade. O Ministério da Saúde recebe os imunizantes e é responsável pelo envio às coordenações estaduais e daí para as centrais regionais, onde as vacinas são disponibilizadas para os postos de saúde. Só em 2021, mais de 233 milhões de doses foram fornecidas ao PNI. Além disso, o Instituto Nacional de Controle de Qualidade em Saúde (INCQS/Fiocruz) realiza importante papel na avalição da qualidade e eficácia dos lotes de vacina distribuídos no país.

“Outros institutos da Fiocruz, como a Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca (ENSP) e Instituto Oswaldo Cruz (IOC) também desenvolvem ações importantes ao PNI, como os testes de campo das vacinas. O programa é uma referência internacional e tem um caráter público que revolucionou a saúde do Brasil, além de ter reforçado nossa capacidade técnica de desenvolvimento tecnológico. Por conta dele, hoje o Brasil tem a capacidade de produzir nacionalmente duas vacinas contra a covid-19”, conclui o historiador Carlos Fidelis da Ponte.

Do Portal Fiocruz

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