Portadora de doença rara realiza o sonho de ser mãe

A psicóloga Verônica Stasiak Bednarczuk levou quatro anos para diagnosticar fibrose cística. ‘A doença é parte do que somos, não o limite do que podemos ser’, diz

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A psicóloga Verônica Stasiak Bednarczuk, de 33 anos, sempre teve graves problemas de saúde. Eram, em média, cinco pneumonias por ano, desde seu nascimento. Boa parte de sua vida poderia ser resumida em “hospital/casa/estudo”, ou, a partir dos 14, “hospital/casa/trabalho/estudo”.

Apesar de ser uma frequente realidade, seus problemas de saúde e internações nunca te impediram de nada. Sempre foi uma criança extremamente feliz e brincalhona, uma adolescente cheia de amigos e uma jovem super ativa, que começou a trabalhar e cursar psicologia muito cedo. Aos 14 anos, já estava no seu primeiro emprego e, aos 17, na faculdade.

Aos 18 anos, descobriu que parte do seu pulmão direito não funcionava mais e que o único tratamento seria uma cirurgia para retirar o lobo superior, que estava “calcificado” pela imensa quantidade de pneumonias que já tinha tido. O nome da doença que havia se desenvolvido era bronquiectasia.

Como ela precisava se preparar com fisioterapia respiratória, a operação foi agendada para o final de 2005. Terminou o terceiro semestre de psicologia e foi para a cirurgia, onde era muito provável que a retirada da parte do pulmão, que não funcionava mais, seria a “solução dos problemas” e a expectativa dos médicos e de sua família era que ela não tivesse mais tantas pneumonias.

Porém, no pós-operatório, teve uma necrose no lobo médio do mesmo pulmão, que fez com que precisasse tirá-lo também. E as complicações não pararam por aí. No pós-operatório da segunda cirurgia, ela teve uma grave infecção, que a deixou em isolamento na UTI por alguns dias.

Verônica teve alta para continuar o tratamento em casa com internamento domiciliar para evitar também o agravamento com novas infecções hospitalares. Ainda em recuperação, voltou à faculdade, em seguida começou um novo estágio após três meses da primeira cirurgia, mas as expectativas não foram atingidas. Novos quadros de pneumonia apareceram em 2006 e 2007.

Em 2008 precisou operar novamente, dessa vez para retirar a vesícula, e ela continuou tendo quadros de pneumonia e crises respiratórias graves. Em julho de 2009, aos 22 anos, durante férias do trabalho, começou a sentir sintomas de gripe, que rapidamente evoluíram para uma nova pneumonia. Foi internada, e precisou de ajuda de aparelhos para respirar, 24 horas por dia. Foram mais ou menos dois meses de internação.

Assim que começou a melhorar e conseguiu passar o dia sem usar o oxigênio portátil, a psicóloga voltou a trabalhar. Porém, no dia seguinte do seu retorno ao trabalho, foi internada com pancreatite. Foram mais dez dias de internação, mas dessa vez foram surpreendidos por um médico gastroenterologista, que ao ouvir todo o seu histórico de pneumonias, internações e cirurgias suspeitou que ela poderia ter fibrose cística, uma doença genética grave, rara, que por conta de um defeito na condução de uma proteína, toda a secreção do organismo do portador é mais espessa que o normal, dificultando sua eliminação.

Os principais sintomas que essa patologia desencadeia são pneumonia de repetição, tosse crônica, dificuldade para ganhar peso e estatura, diarreia, suor mais salgado que o normal e pólipos nasais. Ao descobrir que tinha fibrose cística, a psicóloga começou a pesquisar, mas não encontrou muitas informações sobre o diagnóstico precoce e tratamentos.

Assim que teve alta, fez o teste do suor, exame considerado “padrão ouro” para o diagnóstico da doença, cujo valor de referência era 60 e o dela deu 199. E, em 2009, com 23 anos, foi oficialmente diagnosticada com fibrose cística.

Aquele era o início de um novo, e um dos mais importantes, capítulos da minha história. Descobri que tudo o que eu havia passado durante toda a minha vida era uma doença que eu e minha família não fazíamos ideia do que se tratava. Comecei a pensar em quantas pessoas estavam sofrendo com os mesmos sintomas com que eu sofri a vida toda, simplesmente pela ausência de um diagnóstico correto, ou aquelas que já não estavam mais aqui porque não tiveram a chance que eu tive de ser diagnosticada e tratada”, afirma a psicóloga.

Como surgiu o sonho de criar uma ONG

Em uma das noites no hospital, pegou algumas anotações de um sonho que teve durante sua última internação, e onde havia fundado um grupo para ajudar pessoas com problemas respiratórios. “Eu e algumas pessoas estávamos embaixo de uma árvore, num campo bem verde, e eu falava sobre a importância que precisamos dar para o ar que respiramos. Naquele momento, eu dependia 24h por dia de um aparelho para conseguir respirar, e eu queria que as pessoas entendessem que devíamos valorizar aquilo”, conta ela.

Iniciava aí uma nova história para a vida de Verônica e para a vida de muitas pessoas. “Uni o sonho a minha formação em Psicologia, ao meu diagnóstico tardio e a minha experiência em projetos e fundei o Unidos pela Vida, que inicialmente era um blog, no qual eu contava minhas experiências e conhecia pessoas da mesma realidade,” conta a fundadora da ONG.

No final de 2011, o Instituto Unidos pela Vida nasceu, uma associação civil sem fins lucrativos que tem como missão fortalecer e desenvolver o ecossistema da fibrose cística por meio de ações que impactem na melhora da qualidade de vida dos pacientes, familiares e demais interessados. Neste ano, o Unidos pela Vida – Instituto Brasileiro de Atenção à Fibrose Cística, que tem sede em Curitiba e atuação nacional, completa 8 anos de fundação.

Verônica casou com 27 anos e no ano passado, aos 32, passou pelo maior desafio da jornada da sua vida: ser mãe! “Nossa Helena é o nosso pequeno milagre. Sempre sonhei em ser mãe, e ao lado do meu marido, nos preparamos muito para este momento. Foram anos de tratamento intenso para que meu pulmão estivesse resistente o bastante para a gestação, para que eu estivesse sem infecções ou complicações mais graves. E tudo ocorreu dentro do esperado!” afirma Verônica.

O motivo dela contar essa história é compartilhar com outros portadores da Fibrose Cística ou de qualquer outra patologia ou dificuldade seu grande lema: “Nenhum sonho é impossível, se o percorrermos com força, fé e coragem! Por aqui, falamos que a Fibrose Cística é parte do que somos, não o limite do que podemos ser!”.

É possível ter uma vida normal

A missão do Instituto é fortalecer e desenvolver o ecossistema da fibrose cística por meio de ações que impactem na melhora da qualidade de vida dos pacientes, familiares e demais interessados. Atualmente, a organização desenvolve e promove projetos por meio de programas nas áreas de educação e pesquisa, incentivo à atividade física, comunicação e suporte, desenvolvimento organizacional, advocacy e políticas públicas.

Neste ano, a campanha “A Fibrose Cística é parte do que somos, não o limite do que podemos ser”, realizada durante o Setembro Roxo –  Mês Nacional de Conscientização da Fibrose Cística, tem como objetivo demonstrar que as pessoas diagnosticadas tardiamente com a doença podem realizar atividades cotidianas como trabalhar, praticar esportes, ter filhos e estudar, de acordo com seu tratamento e condição de saúde

A ideia é reforçar que, apesar da fibrose cística fazer parte da vida da pessoa, não existe empecilhos para realizar seus sonhos. Com o diagnóstico precoce e o tratamento adequado, qualquer um pode buscar ter uma vida normal, dentro dos limites da doença, e tentar viver da melhor maneira possível”, completa Verônica.

Em 2018, o Instituto Unidos Pela Vida foi reconhecido como uma das 100 Melhores ONGs do Brasil e, dentre elas, eleita como a melhor ONG de pequeno porte do Brasil pelo Instituto Doar, Rede Filantropia e O Mundo que Queremos, com apoio da revista Época, Grupo Folha e Editora Globo.

Mais sobre a doença

A fibrose cística é a mais comum entre as doenças raras. No mundo, cerca de 70 mil pessoas são portadoras da doença e no Brasil, estima-se que, a cada dez mil nascidos vivos, um seja portador de fibrose cística.

No entanto, por aqui, a taxa de mortalidade atinge cada vez mais cedo os pacientes, muitas vezes por dificuldades no diagnóstico e no tratamento correto.

Existe uma discrepância entre a idade de óbito pela doença no país comparado a outros países – enquanto nos Estados Unidos é de 29,6 anos, no Brasil esse número é de 14,6 anos”, ressalta Fernando Afonso, presidente da Vertex no Brasil.

Essa doença genética rara que faz com que a secreção do organismo seja mais espessa que o normal, desencadeando diversos sintomas, como suor mais salgado, tosse crônica, dificuldade em ganhar peso e estatura, pneumonias frequentes e diarreia. É causada por mutações no gene CFTR, que criam proteínas defeituosas ou ausentes, o que leva a um baixo fluxo de sal e água para dentro e para fora das células em vários órgãos, em especial nos pulmões.

A doença não tem cura, mas quanto antes for feito o diagnóstico, maiores as chances de tratamento e sobrevida dos pacientes. A doença pode ser identificada no Programa Nacional de Triagem Neonatal (PNTN), mais conhecido como teste do pezinho.

  • “É muito importante que as pessoas tenham conhecimento da doença para identificar sintomas e ir atrás do tratamento adequado. A complexidade das doenças raras exige atenção redobrada para formulação de políticas de saúde que minimizem o impacto social de milhares de pessoas e familiares”, ressalta Fernando Affonso.

  • Segundo ele, a Vertex, indústria farmacêutica com foco em pesquisa e desenvolvimento de tratamento para pacientes com fibrose cística, chegou ao Brasil há menos de 3 anos e já tem aprovação da Anvisa para dois medicamentos que melhoram a qualidade de vida dos pacientes que possuem essa doença rara.

SOBRE A DATA E O SETEMBRO ROXO

  • 8 de Setembro é considerado o Dia Mundial da Fibrose Cística. Foi nessa data, em 1989, que foi publicado na revista Science a descoberta do gene CFTR pelos médicos Lap-Chee Tsul, John Riodan e Francis S. Collins.
  • O Setembro Roxo é promovido pelo Instituto Unidos pela Vida com o intuito de conscientizar a sociedade sobre a doença e a importância do diagnóstico precoce. É possível identificá-la pelo teste do pezinho e a sua confirmação se dá por meio do diagnóstico do teste do suor. A data surgiu para contribuir com a busca do diagnóstico precoce e melhorar a qualidade de vida das pessoas com a doença.

    Em parceria com associações de assistência e voluntários, o instituto promove eventos e ações presenciais de conscientização em mais de de 40 cidades em todo o Brasil para falar sobre a doença. No dia 15 de setembro será realizada a Caminhada pela Fibrose Cística na cidade de Niterói (RJ). O evento começa às 9h e todos da região estão convidados para participar da atividade. A atividade é uma realização da Associação Carioca de Assistência a Mucoviscidose (ACAM-RJ). Saiba mais pelo site www.unidospelavida.org.br ou pelo perfil facebook.com/unidospelavida.

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