Abuso sexual infantil: como vencer essa batalha para proteger nossas crianças?

Campanha no Estado do Rio alerta para o grave problema da pedofilia. Em São Paulo, aumentaram estupros de vulneráveis em 2018

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Quando o assunto é cuidar e proteger nossas crianças e adolescentes, lamentavelmente, o Brasil tem estatísticas assustadoras. Entre 2011 e 2017, houve um aumento de 83% nas notificações gerais de violências sexuais contra esse público, segundo boletim epidemiológico divulgado em junho de 2018 pelo Ministério da Saúde. No período foram notificados 184.524 casos de violência sexual, sendo 58.037 (31,5%) contra crianças e 83.068 (45%) contra adolescentes.

Os dados revelam que 51% das meninas abusadas sexualmente têm de 1 a 5 anos. A maioria dos casos, tanto com crianças quanto com adolescentes, ocorreu dentro de casa e os agressores são pessoas do convívio das vítimas, geralmente familiares. O estudo também mostra que a maioria das violências é praticada mais de uma vez.

É também estarrecedor ver o desconhecimento da sociedade sobre o assunto. O tema é um dos destaques da edição 2019 do XXIV Congresso Paulista de Ginecologia e Obstetrícia, realizado neste fim de semana em São Paulo.

Fruto de parceria firmada com o Instituto Liberta e a Folha de S. Paulo, o painel “Exploração sexual de crianças e adolescentes: o tamanho do problema e a responsabilidade do ginecologista e obstetra” foi realizado nesta sexta-feira (23), com participação de especialistas nessa grave questão social e de saúde pública.

No caso dos médicos especialistas em Ginecologia e Obstetrícia, é essencial compreender a proporção do drama, preparar-se para o acolhimento, ter consciência da importância da notificação e de como fazê-la, entre outros itens”, afirma Rossana Pulcineli Vieira Francisco, presidente da Sogesp – Sociedade de Ginecologia e Obstetrícia de São Paulo.

A presidente do Instituto Liberta, Luciana Temer, completa: “Temos milhares de meninas e meninos que se submetem a uma vida indigna, que certamente trará consequências traumáticas quase insuperáveis. Diante desse quadro, Governo e sociedade civil devem assumir seus papéis”.

Rio de Janeiro cria data especial e lança campanha

No Rio de Janeiro, não foram divulgados dados atualizados, mas a questão preocupa. Tanto que o governador Wilson Witzel decidiu, por meio de decreto publicado há três meses, pela criação, no dia 24 de agosto, do Dia Estadual do Combate à Pedofilia e ao Abuso Sexual Infantojuvenil. O objetivo é conscientizar sobre esta triste realidade, que demanda investimentos, capacitação de profissionais e aprimoramento da tecnologia necessária para as investigações.

A data foi lembrada neste sábado (24), quando é celebrado o Dia Mundial da Infância, criado pela Unicef para promover a reflexão sobre as condições sociais, econômicas e educacionais das crianças no mundo. Também para marcar a data, a Secretaria de Estado de Desenvolvimento Social e Direitos Humanos, por meio de sua Coordenadoria de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, realizou esta semana (dia 22) um seminário sobre “Combate à Pedofilia e o Abuso Sexual Infanto-juvenil”, no auditório da Procuradoria Geral do Estado.

De acordo com a Coordenadoria, a violência sexual é uma forma de violação dos direitos sexual sendo ato de abuso e exploração para com o corpo e a sexualidade de crianças e adolescentes. O abuso sexual caracteriza-se pelo aproveitamento da sexualidade de uma criança ou adolescente.

Previstos em lei, são consideradas como abuso práticas como aliciamento, beijos, carícia, carinhos inapropriados, exibição/exposição da criança na prática de masturbação ou em um ambiente que possa propiciar a prática sexual com um adulto ou através de pornografia visual, assim como a penetração forçada etc.

Já a pedofilia está entre os transtornos de preferência sexual caracterizado como doença e é tida como “preferência sexual por crianças pré-púberes (que ainda não atingiram a puberdade) ou no início da puberdade, de acordo com a OMS”, conforme estabelece a CID-10 (Classificação Internacional de Doenças).

De acordo com a Secretaria, o Governo do Estado do Rio tem trabalhado por meio de mobilização e sensibilização para conscientizar o grande público a denunciar determinados casos de pedofilia e abuso sexual de crianças e adolescentes diretamente ao “Dique 100”. Outro telefone de contato é o (21) 2334-5539, que funciona das 9 às 18 horas, de segunda a sexta-feira.

Estupro de vulnerável cresceu em São Paulo em 2018

A preocupação com as crianças é ainda maior em relação aos casos de estupro de vulnerável.  De acordo com os dados divulgados pela Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo, o número de casos de estupro cresceu em todo o estado em 2018. Foram 11.950 boletins de ocorrência registrados, o equivalente a 32 casos por dia, uma alta de 7,76% em relação ao ano de 2017. Esse é o maior índice desde 2013.

Os crimes cometidos contra pessoas consideradas vulneráveis tiveram a alta ainda mais acentuada, cerca de 14,3%, com 8,6 mil casos. Só na capital paulista, enquanto o número de denúncias de estupro cresceu 1,7%, os registros de estupro contra vulneráveis cresceu 10,6%.

Em 2013, houve 12 mil registros, mas esse índice caiu nos dois anos seguintes. No entanto, desde 2016, as autoridades policiais apontam que esse tipo de crime está em ascendência. Em Taubaté, de fevereiro de 2017 a 2018 foram registradas 30 denúncias, o número cresceu para 48 no mesmo período de 2018 a 2019.

Estima-se que esse número pode ser ainda maior, já que a maioria dos abusos acontece dentro de casa, por algum familiar da vítima. No Hospital Universitário de Taubaté são atendidos em média 3 vítimas desse tipo de crime  por semana.

No Brasil, maioria das vítimas são meninas

Na maioria dos casos – 43.034 (74,2%) – a vítimas eram do sexo feminino e 14.996 (25,8%) eram do sexo masculino. Do total, 51,2% estavam na faixa etária entre 1 e 5 anos, 45,5% eram da raça/cor da pele negra, e 3,3% possuíam alguma deficiência ou transtorno.

Entre as crianças do sexo feminino com notificação de violência sexual, destaca-se que 51,9% estavam na faixa etária entre 1 e 5 anos, e 42,9% estavam na faixa etária entre 6 e 9 anos. Além disso, 46,0% eram da raça/cor da pele negra, e as notificações se concentraram nas regiões Sudeste (39,9%), Sul (20,7%) e Norte (16,7%).

Entre as crianças do sexo masculino com notificação de violência sexual, destaca-se que 48,9% estavam na faixa etária entre 1 e 5 anos e 48,3% entre 6 e 9 anos, 44,2% eram da raça/cor da pele negra, e as notificações se concentraram nas regiões Sudeste (41,8%), Sul (24,6%) e Norte (12,7%).

Entre as crianças do sexo feminino, a análise das notificações de violência sexual mostrou que 33,8% tiveram caráter de repetição, a residência (71,2%) e a escola (3,7%) foram os principais locais de ocorrência, e 61,0% dos eventos foram notificados como estupro. Entre as crianças do sexo masculino, a avaliação das notificações de violência sexual mostrou que 33,2% tiveram caráter de repetição, e a residência (63,4%) e a escola (7,1%) também foram os principais locais de ocorrência.

Em números gerais, 33,7% dos eventos de violência sexual contra crianças tiveram caráter de repetição, 69,2% ocorreram na residência e 4,6% ocorreram na escola, e 62,0% foram notificados como estupro.

Entre 2011 e 2017 houve um aumento geral de 83% nas notificações de violências sexuais e um aumento de 64,6% e 83,2%, respectivamente, nas notificações de violência sexual contra crianças e adolescentes.

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Guia para crianças vítimas de violência

O Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP), por meio da Comissão da Infância e Juventude (CIJ) lança no dia 22 de agosto o Guia Prático para Implementação da Política de Atendimento de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência. Será durante o evento Meios Alternativos de Solução de Conflitos, com ênfase em Infância e Juventude, no Instituto Serzedello Corrêa, em Brasília-DF.

O material foi produzido pelo Grupo de Trabalho de Acompanhamento do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência, instituído pela Portaria CNMP-PRESI nº 61, de 24 de maio de 2018.

O guia visa a auxiliar os membros do Ministério Público, no exercício de suas atribuições, a buscarem a implementação, sobretudo em âmbito municipal, de uma política pública eficiente voltada a atender crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas de violência, procurando dar efetividade ao contido na Lei nº 13.431/2017 e no Decreto nº 9.603/2018, que a regulamentou.

Por questão de metodologia, o Guia Prático será dividido em cinco partes: (1) Mapeamento e articulação da “rede de proteção” a crianças e adolescentes vítimas de violência; (2) Fomento à deliberação do Plano Municipal destinado à prevenção, ao enfrentamento e ao atendimento especializado de crianças e adolescentes vítimas de violência, em suas mais variadas formas, com ênfase para os casos de abuso e exploração sexual; (3) Escuta especializada; (4) Depoimento especial; e (5) Comentários ao Decreto nº 9.603/2018.

A publicação também fornece diversos modelos de peças processuais e extraprocessuais que, sempre que necessário, poderão ser utilizados para implementação da Política de Atendimento de Crianças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência e dos mecanismos que a integram. Leia a íntegra da publicação em www.cnmp.mp.br.

Um novo canal de denúncias sobre violações

O Ouvidor Nacional de Direitos Humanos, Fernando Pereira, anunciou em live organizada pela Childhood Brasil, que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos irá lançar, em breve, um serviço de denúncia para violações contra crianças e adolescentes pelo aplicativo WhatsApp.

Pereira conversou no último dia 14 com Eva Dengler, gerente de Programas e Relações Empresariais da Childhood Brasil, sobre a importância dos canais de denúncia contra abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes e as estratégias do órgão no atendimento durante a pandemia do Covid-19.

A denúncia é componente principal no combate a violações de direitos humanos. Se as pessoas não denunciarem, não temos acesso a essas informações. Mesmo que a gente saiba que isso acontece, sem acesso não podemos efetivar as políticas públicas e entregar a denúncia para a autoridade competente”, defende Pereira.

Em dezembro, o canal de atendimento foi reformulado e ganhou novas plataformas digitais, inclusive com atendimento em Libras, para casos de violação de direitos humanos.).

O bate-papo com o Ouvidor Nacional integra a campanha da Childhood Brasil “O Covid-19 também é perigoso para crianças e adolescentes”, que alerta que além do vírus em si, o isolamento social pode deixar esse grupo exposto a situações de maior vulnerabilidade. Estatísticas apontam que a maioria das violações de direitos humanos é cometida em casa.

Levantamento da Childhood Brasil revela que apenas 10% dos casos de abuso sexual de crianças e adolescentes são denunciados, escondendo uma grande subnotificação do problema.

“Temos um desafio muito grande de proteger meninos e meninas que estão enfrentando uma mudança drástica de rotina”, explica Eva. A campanha (www.childhood.org.br/covid) faz parte da mobilização do Dia Nacional de Combate ao Abuso e à Exploração Sexual de Crianças e Adolescente, realizada em 18 de maio.

Principais canais de denúncia

O canal do Disque 100 funciona diariamente, 24 horas por dia, incluindo sábados, domingos e feriados. As ligações podem ser feitas de todo o Brasil de forma gratuita e anônima, de telefone fixo ou celular, bastando discar 100. Qualquer pessoa pode denunciar uma violação de direitos humanos que tenha presenciado ou observado.

Outro canal é o Ligue 180, que acolhe registros, analisa e encaminha as denúncias de violações dos direitos humanos das mulheres – como violência, assédio, feminicídio, entre outros. A Ouvidoria Nacional também recebe denúncias pelo site: ouvidoria.mdh.gov.br.

Recentemente, foi lançado o aplicativo Direitos Humanos BR, que integra o Disque 100 e Ligue 180, para receber denúncias, solicitações e pedidos de informação sobre direitos humanos e família. O serviço, disponível para Android e IOS, também conta com atendimento em Libras.

Acesse a íntegra do bate-papo em: @childhoodbrasil (perfil no Instagram)

Da Redação, com Assessorias

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