Violência obstétrica: a saúde mental da mulher afetada pelo parto traumático

Após caso de estupro em sala de parto, psicanalista Andrea Ladislau analisa impactos da violência obstétrica à saúde mental de mulheres

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Por Andrea Ladislau*

Infelizmente, nos últimos tempos estamos presenciando inúmeras violências sofridas pelas mulheres. Violências que deixam marcas severas, sejam físicas ou emocionais. Mas pouco se fala sobre a violência causada por um parto traumático. Porém, ela é real e, infelizmente, nem todos os casos ocorridos são divulgados. Seja por falta de informação e conhecimento da mulher para entender que sofreu uma violência obstétrica, ou mesmo, por medo de represálias.

Mas é muito importante descortinar inúmeras situações não expostas dentro das maternidades e centros cirúrgicos que recebem as mulheres no momento do nascimento de seus filhos. Essa violência pode ser caracterizada por abusos, maus tratos ou desrespeito ao longo da gestação ou durante o trabalho de parto. Ou, até mesmo, abuso sexual. Foi o caso da mulher estuprada por um médico anestesista logo após dar à luz em um hospital público da Baixada Fluminense que acendeu o alerta vermelho.

Estudos revelam que, em média, 30% das mulheres descrevem o parto como traumático, com a prevalência de Transtorno do Estresse pós traumático (TEPT). Mas um dos grandes pontos é que este transtorno não se resume apenas às lesões físicas, temos muitos relatos de dores subjetivas, relacionadas à inadequação na assistência médica durante os procedimentos de urgência.

A violência obstétrica é um tipo de violência de gênero, praticada durante o cuidado obstétrico profissional, caracterizada pelo desrespeito, abusos e maus-tratos durante a gestação e/ou no momento do parto, de forma psicológica, verbal ou física e, consequentemente, torna um dos momentos mais importantes na vida de uma mulher em um momento traumático e devastador.

Ela compreende desde ter o direito de um acompanhante na hora do parto negado, falta de esclarecimentos sobre o procedimento, até intervenções invasivas desnecessárias, como também comentários constrangedores, ofensas, humilhações ou xingamentos e negligência. 

Impactos da violência obstétrica na saúde mental da mulher

Mas quais são os impactos dessa violência para a saúde mental de uma mulher que vive um momento tão delicado como o nascimento de um filho? As consequências da violência obstétrica vão além dos danos imediatos, o trauma reflete seriamente na saúde da mulher, pois, é vivenciado em um momento decisivo em vários aspectos da vida e na saúde, física e mental, tanto do bebê como da mãe.

O parto traz grandes alterações físicas, hormonais, psíquicas, a mulher se vê diante de uma transformação dos seus papéis sociais e suas relações. Por consequência, existem possibilidades do aparecimento de um quadro de tristeza ou surgimento de transtornos psiquiátricos que interfere no vínculo afetivo saudável entre a mãe e bebê, que é potencializado no caso de violência obstétrica. 

O constrangimento é o primeiro sentimento que as mulheres enfrentam após a violência. A angústia é intensificada e podem desenvolver e potencializar uma sensação de inferioridade, medo e insegurança, através da humilhação, reforçando sentimentos de incapacidade, inadequação e impotência da mulher e do seu corpo. Outro ponto extremamente relevante é que, tanta dor e sofrimento podem desencadear o medo de uma nova gestação por causa da experiência vivida.

Depressão pós-parto é uma das consequências: como lidar?

Aliás, essa é uma das principais queixas da mulher que sofreu esse tipo de violência. Em geral, a grande maioria aponta indícios de depressão pós-parto. Fato é que, as vivências experimentadas desse momento fazem parte dos sentimentos, pensamentos e das relações das mulheres no processo de construção do significado da maternidade, por isso, é preciso considerar o impacto que o trauma provoca em cada mulher. Ou seja, as consequências de uma violência obstétrica atravessam o sentido de ser mãe e a própria história dessa gestante.

Enfim, a consciência das circunstâncias desse trauma requer a verbalização, a denúncia e a busca de ajuda de um profissional de saúde mental para que as mulheres possam fortalecer o seu emocional a ponto de não ferir e prejudicar o desenvolvimento saudável da maternidade e do cuidado com o recém-nascido.

Os expostos alertam para a real necessidade de expor as agressões físicas e psicológicas, numa urgente demanda do preparo das equipes obstétricas para que não provoquem traumas e saibam entender a importância de um trato humanizado tanto para a mulher quanto para a criança.

Andrea Ladislau, doutora em Psicanálise Contemporânea (Foto: Pedro Costa)

*Andrea Ladislau é pós-graduada em Administração Hospitalar e Psicanálise e doutora em Psicanálise Contemporânea. Possui especialização em Psicopedagogia e Inclusão Digital. É também graduada em Letras e Administração de Empresas, palestrante, membro da Academia Fluminense de Letras e escreve para diversos veículos. Na pandemia, criou no Whatsapp o grupo Reflexões Positivas, para apoio emocional de pessoas do Brasil inteiro.

Contatos: Instagram: @dra.andrealadislau / Telefone: (21) 96804-9353 (Whatsapp)

Andrea Ladislau colabora para a seção Palavra de Especialista toda quarta-feira. Dúvidas e sugestões para palavradeespecialista@vidaeacao.com.br.

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